segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

O CASO DATENA E O RETROCESSO DAS INSTITUIÇÕES JURIDICAS

Dr. BELCORÍGENES DE SOUZA SAMPAIO JÚNIOR


Hoje li a seguinte manchete: Datena é condenado em processo por “discriminação homofóbica”. Será que estamos diante de mais uma burrice judicial? De acordo com matéria do jornal Folha de S. Paulo:


“O apresentador José Luiz Datena foi condenado a uma advertência pela Secretaria da Justiça de SP, no processo administrativo que a Defensoria Pública move contra ele por “discriminação homofóbica”. O processo partiu de uma reportagem no programa “Brasil Urgente” durante a qual Datena usou expressões como “travecão butinudo do caramba” ao falar de um travesti. A informação é da coluna Mônica Bergamo, publicada na Folha desta segunda-feira (27). “Não houve discriminação. Falei sobre a agressão [depois da briga, o travesti empurrou o cinegrafista] e não sobre a opção sexual da pessoa”, diz Datena. A Defensoria vai recorrer pedindo que Datena seja multado em R$ 246 mil.” (1)


Não conheço a íntegra do processo que envolve o apresentador, mas gostaria de começar pela própria inconsistência conotativa da palavra “homofobia”, que é interpretada como “medo de homossexual”. Alguém em sã consciência acredita que Datena tenha medo de homossexuais?

Se o fundamento da condenação foi a frase “travecão butinudo do caramba”, conforme reportagem, o que seria então se afirmasse “travecão feio pra burro”? Ora, só mesmo qualificando como imbecil esse tipo de patrulhamento que se aproveita de qualquer gesto ou atitude minimamente suspeita com relação aos homossexuais para transformar o caso em uma apoteose pró-sodomia. Quando isso vai encontrar bom termo? Viva o bom senso, por favor.

Lembro-me de outro apresentador de televisão que foi “demitido por telefone” sob alegação similar e depois saiu da TV brasileira, mudando-se para Portugal. Há algum tempo em entrevista televisiva ele afirmou que dentre as “ajudantes de palco” no seu programa no Brasil existiam dois transexuais, coisa que ninguém sabia. Olha o paradoxo: o rapaz empregava legalmente dois homossexuais e era acusado de homofóbico. Vai entender…

Contudo, é possível sim entender: trata-se de um tipo orquestrado de histeria coletiva das chamadas “minorias pseudo-perseguidas”. Se isso vai ser a regra a partir de agora neste Brasil de pão e circo, que tal incluir dentre as tais minorias os judeus ortodoxos, os cristãos conservadores, os índios pataxos, os negros albinos, os orientais pintados com trejeitos de imbecis nas paródias no cinema e na televisão.


Ronald Dworkin disse:

“O Estado poderia então proibir a expressão vívida, visceral ou emotiva de qualquer opinião ou convicção que tivesse uma possibilidade razoável de ofender um grupo menos privilegiado. Poderia por na ilegalidade a apresentação da peça o mercador de Veneza, os filmes sobre mulheres que trabalham fora e não cuidam direito dos filhos e as caricaturas ou paródias de homossexuais nos shows de comediantes. Os tribunais teriam de pesar o valor dessas formas de expressão, enquanto contribuições culturais ou políticas, contra os danos que poderiam causar ao status ou à sensibilidade dos grupos atingidos”. (2)

O Grupo Gay da Bahia pode afirmar que a Jesus Cristo era gay, porém quando os cristãos afirmam exatamente o inverso é discriminatório? Que justiça de dois pesos e duas medidas é esta? O que há é uma justiça oficial e vendida aos holofotes da mídia chique, que distribui Medalhas Oficiais para quem defende um circo de horrores em avenida pública, uma verdadeira defenestração da imagem humana, chamada “passeata gay”. Medalhas para quem defende a família e a monogamia não existem. Só cadeia e multa. Não é a toa que a nossa balança de exportação de aberrações sexuais seja superavitária, além de sermos um destino preferido para o turismo sexual, pedofílico principalmente. Aliás, desde a colonização, nada mudou neste sul do equador.

A questão é a seguinte: cada um tem o direito de defender a ideologia que quiser, seja ela pró ou contra qualquer coisa (desde que lícita). Mas o Estado não pode violentar a liberdade de pensamento e de expressão dos seus cidadãos, pois isso equivale a estabelecer um ilegítimo tribunal cultural. Conheço um líder cristão que está fora do Brasil, pois foi ameaçado por grupos homossexuais brasileiros que querem promover uma batalha de processos e violências contra ele. É o imperialismo gayizista que almeja CALAR toda voz discordante, enquanto tenta PURIFICAR com a Vara do Estado o mundo dos insuportáveis heterossexuais convictos. Aliás, quem ainda tem a coragem de possuir e defender convicções neste mundo de ambigüidades convenientes?

Sou contra qualquer incitação de violência ideológica ou física, porém cercear a livre manifestação do pensamento é um retorno à idade das trevas.

Deus nos livre destes radicais da mordaça. Viva a liberdade.



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O Dr. Belcorígenes de Souza Sampaio Júnior é advogado, professor de Direito Constitucional e Hermenêutica Jurídica, Mestre em Direito Pela UFPE, Mestre em Direitos Fundamentais (D.E.A.) Pela UBU/Espanha, doutorando (em fase de depósito de Tese) em Liberdades Públicas pela UBU/ Espanha.

E-mail do autor: bsampaiojr@bol.com.br

NOTAS:

1- http://noticias.bol.uol.com.br/entretenimento/2010/12/27/datena-e-condenado-em-processo-por-discriminacao-homofobica.jhtm
2- DWORKIN, Ronald. O direito da Liberdade: a leitura moral da Constituição norte-americana. Trad. M. Brandão Cipolla. São Paulo: Martins Fontes, 2006.


Fonte: www.juliosevero.com

http://juliosevero.blogspot.com/2010/12/o-caso-datena-e-o-retrocesso-das.html


Leia também do Dr. Belcorígenes Sampaio:

Liberdade religiosa versus liberdade de expressão

27 de dezembro de 2010

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

A CRUZ ANTIGA E A NOVA.

Por Pr. W. A. Tozer*


Totalmente sem aviso e desapercebida, uma nova cruz surgiu nos círculos populares evangélicos nos tempos modernos. parece-se com a antiga cruz, mas é diferente: AS SEMELHANÇAS SÃO SUPERFICIAIS; AS DIFERENÇAS, FUNDAMENTAIS.*

Desta nova cruz brotou uma nova filosofia da vida cristã, e dessa nova filosofia proveio uma nova técnica evangélica - um novo tipo de reunião e uma nova espécie de pregação. Esta nova evangelização emprega a mesma linguagem da antiga, mas seu conteúdo não é o mesmo e a sua ênfase não é como antes. A CRUZ ANTIGA NÃO FAZIA BARGANHAS COM O MUNDO. Para a jactanciosa carne de adão, ela significava o fim da jornada, punha em execução a sentença imposta pela lei do Sinai. A NOVA CRUZ NÃO SE OPÕE À RAÇA HUMANA; ao contrário, é uma companheira amigável e, se corretamente entendida, é fonte de oceanos de boa e limpa diversão e de inocente prazer. Ela deixa Adão viver sem interferência. A motivação da sua vida não sofre mudança; o seu prazer continua sendo a razão do seu viver, só que agora ele se deleita em cantar (...)

A NOVA CRUZ ESTIMULA UMA ABORDAGEM EVANGELÍSTICA NOVA E INTEIRAMENTE DIVERSA. O evangelista não exige renúncia da velha vida para que se possa receber a nova. ELE NÃO PREGA CONTRASTES; PREGA SIMILARIDADES. PROCURA CAMINHO PARA O INTERESSE DO PÚBLICO MOSTRANDO QUE O CRISTIANISMO NÃO FAZ EXIGÊNCIAS DESAGRADÁVEIS; AO INVÉS DISSO, OFERECE A MESMA COISA QUE O MUNDO OFERECE só que num nível mais alto.

Seja o que for que o mundo enlouquecido pelo pecado reclame para si no momento, com inteligência se demonstra que exatamente isso o evangelho oferece, SÓ QUE O PRODUTO RELIGIOSO É MELHOR. A nova cruz não destrói o pecador; redireciona-o. Aparelha-o para um modo de viver mais limpo e mais belo e poupa o seu respeito próprio. Àquele que é auto-afirmativo, ELA DIZ: "VENHA E AFIRME-SE POR CRISTO". Ao egoísta diz: "VENHA E EXALTE-SE NO SENHOR". ao que procura viva emoção diz: "VENHA E GOZE A VIBRANTE EMOÇÃO DO COMPANHEIRISMO CRISTÃO".

A MENSAGEM CRISTÃ SOFRE TORÇÃO NA DIREÇÃO DA MODA EM VOGA, para que se torne aceitável ao público. a filosofia que está por trás desse tipo de coisa pode ser sincera, MAS SUA SINCERIDADE NÃO A FAZ MENOS FALSA. É FALSA PORQUE É CEGA. FALTA-LHE POR COMPLETO TODO O SIGNIFICADO DA CRUZ. A antiga cruz é um símbolo de morte. Ela representa o abrupto e violento fim do ser humano. Na época dos romanos, o homem que tomava sua cruz e se punha a caminho já tinha dito adeus a seus amigos. Não voltaria. Estava saindo para o término de tudo. A cruz não fazia acordo, não modificava nada e nada poupava; eliminava o homem, completamente e para sempre. Não procurava manter boas relações com a sua vítima. Feria rude e brutalmente, e quando tinha terminado o seu trabalho, o homem já não existia. A raça de Adão está sob sentença de morte.

NÃO HÁ COMUTAÇÃO NEM FUGA. Deus não pode aprovar nenhum fruto do pecado, por mais inocente ou belo que pareça aos olhos dos homens. Deus salva o indivíduo liquidando-o e, depois, ressuscitando-o para uma vida nova. A EVANGELIZAÇÃO QUE TRAÇA PARALELOS AMISTOSOS ENTRE OS CAMINHOS DE DEUS E CAMINHOS DOS HOMENS É FALSA PARA A BÍBLIA E CRUEL PARA AS ALMAS DE SEUS OUVINTES. A FÉ CRISTÃ NÃO É PARALELA AO MUNDO; SECCIONA-O. Quando vimos a Cristo, não elevamos a nossa velha vida a um plano mais alto; deixamo-la aos pés da cruz. O grão de trigo tem de cair no solo e morrer. É preciso que nós, que pregamos o Evangelho, não nos consideremos como agentes de relações públicas enviados para estabelecer boa vontade entre Cristo e o mundo. É PRECISO QUE NÃO NOS IMAGINEMOS COMISSIONADOS PARA TORNAR CRISTO ACEITÁVEL AO GRANDE COMÉRCIO, À IMPRENSA, AO MUNDO DOS ESPORTES OU À EDUCAÇÃO MODERNA.

NÃO SOMOS DIPLOMATAS, MAS PROFETAS, E A NOSSA MENSAGEM NÃO É UM ACORDO, MAS UM ULTIMATO. Deus oferece vida, não porém uma velha vida melhorada. A vida que Ele oferece é vida posterior à morte. É vida que se mantém sempre no lado oposto (posterior) ao da cruz. Quem quiser possuí-la, terá de passar sob a vara. Terá de repudiar-se a si próprio e aquiescer-se à justa sentença de Deus que o condena.

Que significa isso para o indivíduo, para o condenado que desejar achar vida em Cristo Jesus? Como poderá esta teologia ser transferida para a vida? SIMPLESMENTE, É PRECISO QUE ELE SE ARREPENDA E CREIA. É preciso que ele abandone os seus pecados e então prossiga e abandone a si mesmo. QUE NÃO CUBRA NADA. QUE NÃO PROCURE FAZER ACORDO COM DEUS, mas incline a cabeça para o golpe do severo desprazer de Deus e reconheça que merece morrer. FEITO ISSO, QUE ELE CONTEMPLE COM SINGELA CONFIANÇA O SENHOR RESSURRETO, E DO SENHOR LHE VIRÃO VIDA, RENASCIMENTO, PURIFICAÇÃO E PODER. A cruz que deu cabo a vida terrena de jesus agora põe fim ao pecador; e o poder que levantou cristo dentre os mortos agora o ressuscita para uma nova vida ao lado de cristo.

A qualquer que faça objeção a isso ou que o considere meramente como uma estreita e particular visão da verdade, permita-me dizer QUE DEUS FIXOU SEU CAMINHO DE APROVAÇÃO NESTA MENSAGEM, DESDE OS DIAS DE PAULO ATÉ AO PRESENTE. QUER EXPOSTO NESTAS EXATAS PALAVRAS, QUER NÃO, TEM SIDO ESTE O CONTEÚDO DE TODA PREGAÇÃO QUE TEM TRAZIDO VIDA E PODER AO MUNDO ATRAVÉS DOS SÉCULOS. Os místicos, os reformadores, os avivalistas, tem posto aqui a sua ênfase, e sinais, maravilhas e poderosas operações do Espírito Santo deram testemunho de aprovação de Deus. OUSAREMOS NÓS, OS HERDEIROS DESSE LEGADO DE PODER, ADULTERAR A VERDADE? OUSAREMOS APAGAR COM OS NOSSOS GROSSEIROS LÁPIS AS LINHAS IMPRESSAS OU ALTERAR O MODELO QUE NOS FOI MOSTRADO NO MONTE? Não o permita deus. PREGUEMOS A VELHA CRUZ E CONHECEREMOS O ANTIGO PODER.


*(OBS: Grifos Nossos)

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*"(...) O artigo "A CRUZ ANTIGA E A NOVA"... apareceu pela primeira vez no jornal Alliance Witness" em 1946."

http://www.musicaeadoracao.com.br/livros/adoracao_guiley/adoracao_guiley_07.htm



SOBRE TOZER:


“(...)Aiden Wilson Tozer nasceu em Newburg Pensilvânia, Estados Unidos, em 21 de abril de 1897... em 1915, ele se converteu a Cristo... Em 1919, começou a pastorear a Alliance Church, em Nutter Fort, West Virginia. Também pastoreou igrejas em Morgantown, West Virginia; Toledo; Ohio; Indianapolis, Indiana; e, em 1928, foi para a Southside Alliance Church, em Chicago. Ali, ministrou até novembro de 1959, quando tornou-se pastor da Avenue Road Church, em Toronto, no Canadá... em 12 de maio de 1963 Tozer foi chamado para a Glória.(...).”


"(...)PENSO QUE MINHA FILOSOFIA SEJA ESTA: TUDO ESTÁ ERRADO ATÉ QUE DEUS ENDIREITE (...) Esta afirmação do Dr. A. W. Tozer resume perfeitamente a sua crença e o que ele tentou realizar durante seus anos de ministério. Sua pregação e seus livros concentraram-se inteiramente em Deus. Ele não tinha tempo para mercenários religiosos que inventavam novas formas para promover suas mercadorias e subir nas estatísticas. Tozer marchou ao ritmo de uma batida diferente e, por esta razão, normalmente não acompanhava os passos de muitas das pessoas que participavam de desfiles religiosos(...) .“


http://www.editoradosclassicos.com/autores_detalhes.php?autor_id=2

sábado, 6 de novembro de 2010

Relativismo moral e aborto

Por Percival Puggina | 23 Março 2009

RESUMO: Os militantes do ceticismo olham para um feto com 10 semanas de gestação – cabeça, tronco, membros, coraçãozinho pulsante, pezinhos de um centímetro – e sugerem tratar-se de “coisa”. Coisa expurgável, como muco nasal, ou extraível, como cálculo biliar. Percebeu o paradoxo, leitor?



Não por acaso, Paul Johnson abre seu extraordinário “Tempos Modernos” com um capítulo sobre o relativismo moral. Trata-se de tema central do século. Johnson adota como ponto de partida para suas reflexões a meticulosidade que marcou o trabalho de Einstein na Teoria da Relatividade. Como se sabe, a comprovação foi alcançada com medições astronômicas feitas durante o eclipse de 29/05/1919. Naquela noite, enquanto a Física era erguida a novos degraus, muitos filósofos deslizavam pelo corrimão, extraindo do fato mais do que ele podia fornecer. Se tempo e espaço são relativos – alardearam – não há mais verdades nem certezas; não há mais certo nem errado. Era o clarim de alvorada para o relativismo moral. E era o avesso de tudo pelo que Einstein se empenhara. Sua contrariedade diante da apropriação
indébita da relatividade pelo relativismo foi tanta, registra Paul Johnson, que o grande homem da ciência arquejou: soubesse disso teria preferido ser relojoeiro!

Uma coisa é reconhecer a incerteza que caracteriza certas áreas e etapas do conhecimento. Outra é armar barraca nos porões da dúvida sobre tudo e todos. No entanto, a moral relativista alonga os cílios, requebra os quadris e se faz sedutora pela completa liberalidade que disponibiliza. Eu acho, tu achas, ele acha e ninguém tem nada com isso, tá sabendo mano? E a mente, por esse caminho, vai virando uma pipoqueira de dúvidas confortáveis. Se tudo é incerto e relativo não há valores permanentes, limites determináveis nem proibições admissíveis. Família já era, postes fazem xixi nos cachorros e alunos espancam professores.

Vá que seja, estou exagerando um nadinha porque os relativistas têm lá suas convicções. Poucas, mas têm. Uma delas, por exemplo, afirma que os totalitarismos se fundam sobre certezas que não admitem contestação. Estão corretos. É fato histórico. Mas então nem tudo é tão incerto? Existem algumas certezas? Tipo assim: o Inter venceu o Gre-Nal? Os totalitarismos são uma grande droga? Assino embaixo.

Testemos outro acordo: o fato de que só o aborto consegue ceifar mais vidas humanas do que o comunismo entra, também, nessa galeria dos nossos consensos? Suspeito que não. Os militantes do ceticismo olham para um feto com 10 semanas de gestação – cabeça, tronco, membros, coraçãozinho pulsante, pezinhos de um centímetro – e sugerem tratar-se de “coisa”. Coisa expurgável, como muco nasal, ou extraível, como cálculo biliar. Percebeu o paradoxo, leitor? Esse duvidar a tal ponto dos próprios olhos ou é um problema oftalmológico (uma catarata da Razão), ou é o máximo em matéria de fé! Fé na própria dúvida, a despeito de toda evidência.

Os relativistas escamoteiam o fato de que suas incertezas também determinam uma “moralidade”. E é uma “moralidade” pimpona, cheia de si, do topo de cujos saltos altos exerce sua militância materialista, antiteísta e anticatólica. Atenção, porém! Nada há de novo ou moderninho nesse combate à moral contida nos Dez Mandamentos e no Direito Natural. O estado ateu, o apartheid que transforma em subcidadãos os que têm fé, o direito sem referências morais e o materialismo como religião são as unhas e os dentes de sistemas que patrocinaram e patrocinam os grandes horrores dos últimos cem anos. É tudo coisa já testada. E reprovada. Seu alvo são as virtudes e os valores inerentes à tradição judaico-cristã, arrimo dos princípios da dignidade da pessoa humana, do bem comum, da solidariedade, do zelo prioritário pelos mais carentes e de todos os grandes fundamentos da Justiça.

O ateísmo da pseudociência de Stephen Hawking

Por Matthew Cullinan Hoffman | 29 Setembro 2010


RESUMO: Os erros no pensamento de Hawking vão muito mais fundo do que as incoerências e especulações em seu uso da física moderna. Eles implicam interpretação incorreta fundamental acerca das diferenças entre as ciências naturais e as ciências da filosofia e teologia.



Stephen Hawking, professor de física mundialmente famoso, está provocando polêmicas e manchetes ao afirmar em seu livro recente "The Grand Design" (O Plano Magistral) que Deus não é necessário para explicar a existência do universo porque, nas palavras dele, "conforme indicam recentes avanços na cosmologia, as leis da gravidade e a teoria quântica permitem que o universo apareça espontaneamente do nada"." A criação espontânea é a razão de que há algo, em vez de nada, a razão de o universo existir, a razão por que existimos", acrescenta ele. "Não é necessário invocar Deus para acender o detonador e colocar o universo em movimento".

Embora o livro não esteja ainda disponível ao público e somente poucos parágrafos tenham sido citados nos meios de comunicação comerciais, parece que Hawking está fazendo o mesmo jogo que ele fez em sua obra celebrada, "A Brief History of Time" (Uma Breve História do Tempo), que estabeleceu sua fama na década de 1980 e vendeu milhões de exemplares no mundo inteiro. Ele pega teorias que ele confessa não foram comprovadas de modo conclusivo, então usa truques e ilusões verbais para começar a tratá-las sutilmente como fatos. Pior ainda, porém, é seu método de torcer ridículas conclusões filosóficas a partir de tais teorias, insinuando que elas são simplesmente resultado da ciência.

Hawking faz confusão na teoria da "flutuação do vácuo" ao insinuar que a matéria pode de forma simples e espontânea aparecer, criada do "nada". Uma flutuação do vácuo é um evento em que as forças da natureza se manifestam brevemente como "partículas virtuais", de modo que não dá para observá-las brevemente de forma direta, e então desaparecem. Tais entidades teóricas parecem ter um bom apoio da evidência experimental. Contudo, a física não abandonou o princípio da conservação da massa e energia, e o "nada" do qual tais partículas recebem sua massa é de fato algo bem real, conhecido como "energia do vácuo", que permeia todo o espaço.

Os "cosmólogos do quantum", tais como Hawking, estão fazendo uma pequena indústria de especular que eventos como as flutuações do vácuo poderiam resultar na criação de mundos inteiramente novos, embora não tenham nenhuma prova experimental direta de tais eventos ocorrendo. Isso está de acordo com a obsessão geral de Hawking com conceitos altamente teóricos que têm poucos dados reais e concretos para apoiá-los. Ele tem, por exemplo, gasto muitos anos teorizando sobre as propriedades dos buracos negros, entidades cuja própria existência permanece sem provas. É por isso que, apesar de sua grande fama e capacidade inquestionada, ele nunca recebeu o Prêmio Nobel de Física.

Em seu mais recente lance de obter publicidade, Hawking parece estar empregando sua costumeira loquacidade recheada de tapeações para insinuar o aparecimento "espontâneo" do mundo físico, onde o próprio Nada é o criador. A teoria dele frisa flutuações do vácuo, mas aparentemente fugiu da memória dele que a lei da conservação da energia permanece um princípio estabelecido da física. Ele define o "nada" de uma maneira bastante peculiar - aparentemente a energia do vácuo é o "nada". Além disso, Hawking cita dois "nadas" em particular para justificar sua teoria de algo-do-nada, os quais são as leis da gravidade e mecânica quântica (as leis que governam as partículas microfísicas). Ele diz que essas leis possibilitam tais eventos. Será que a gravidade e as leis físicas do quantum são o "nada"?

As atuais declarações de Hawking são semelhantes àquelas que ele fez em sua "Brief History of Time" (Uma Breve História do Tempo), onde ele tentou insinuar que o universo veio do nada porque as pesquisas sugerem que as energias positivas e negativas do universo contrapesam umas às outras. A gravidade, que é uma força de atração, é compreendida como "energia negativa", e o movimento expansivo do universo é visto como "energia positiva".

É claro que se você somar um número negativo e um número positivo cujos valores absolutos sejam iguais, você obtém zero, mas e daí? Será que deveremos concluir que pelo fato de que essas duas variáveis totalizam nada, que tiveram sua origem no nada, ou talvez que nem mesmo existam porque se cancelam reciprocamente? Nesse caso, como é que alguém poderia colocá-los como termos na equação em primeiro lugar? Hawking nunca se importa em responder a questões básicas como essa, ao que tudo indica esperando que sua audiência ingênua e solidária não as pergunte.
Ciência seletiva?

Enquanto faz uso seletivo de teorias novas e não comprovadas para defender seus argumentos, Hawking convenientemente se esquece de mencionar que a interpretação mais comumente aceita da física quântica tem uma tendência de drasticamente minar a posição dele. Essa interpretação é conhecida como a Interpretação de Copenhagen (IC), popularizada por Niels Bohr, físico ganhador de Prêmio Nobel. A IC pressupõe que as partículas realmente não existem até que sejam observadas - elas só existem de um modo potencial, como probabilidades. Aliás, se adotarmos a postura ultra-empírica que Hawking está adotando, em que percepção e realidade são ingenuamente igualadas, essa é a conclusão mais lógica que podemos tirar da moderna física quântica, que usa probabilidades para lidar com opções espinhosas entre precisão de nosso conhecimento sobre a locação e momentum das partículas.

Contudo, se for verdade que as partículas não existem até serem observadas, então os próprios seres humanos não existiriam. Portanto, o universo inteiro só existiria se um observador não físico de fora do universo estivesse fazendo com que ele existisse. Esse é um dos motivos por que alguns físicos que inicialmente adotaram a IC por se encaixar em sua cosmovisão empírica recuaram dela. Eles não gostam das conclusões para as quais ela tende a levá-los. O observador não físico de fora do universo, fazendo com que o universo existisse por meio da observação, parece-se muito com Deus.

O que não é de causar surpresa é que Hawking rejeitou a IC em favor de outra interpretação menos popular chamada a interpretação de "muitos mundos". De acordo com a própria resenha de Hawking acerca do livro, ele aplica essa interpretação de física quântica como se fosse algo que flui da própria ciência, em vez de ser uma suposição que não possui comprovação (e que atualmente não dá para se provar) rejeitada por grande parte dos físicos. Ele então usa essa teoria irreal, que afirma que todo evento quântico gera novos universos alternativos onde se realizam todas as possibilidades, para rejeitar o forte princípio antrópico, que argumenta que a sintonização e ajustes precisos do universo indicam a existência de um Criador. Hawking argumenta que com tantos mundos paralelos, um deles está sujeito a ser favorável à vida, de modo que não se fazem necessárias maiores explicações.

Ciência natural versus filosofia e religião


Entretanto, os erros no pensamento de Hawking vão muito mais fundo do que as incoerências e especulações em seu uso da física moderna. Eles implicam interpretação incorreta fundamental acerca das diferenças entre as ciências naturais e as ciências da filosofia e teologia. Embora as ciências naturais possam dar respostas para perguntas sobre a natureza precisa de objetos físicos e sua conduta, elas não podem responder a perguntas sobre as origens do próprio mundo físico, que é uma área tratada pela teologia, religião e filosofia metafísica.

A verdade é que Hawking publicamente caracteriza seu novo livro como um desafio para a própria filosofia, afirmando que a física moderna é capaz de responder a todas as questões tratadas pelas ciências filosóficas, tornando essas ciências obsoletas.

O absurdo e arrogância de tal afirmação são imediatamente óbvios quando se considera que a física e outras ciências físicas não têm a realidade não física como sua matéria de estudo. A física estuda as coisas físicas. Ela não estuda conceitos puramente abstratos de acordo com sua natureza, como as ciências formais da lógica, matemática e geometria - que são ironicamente ciências de que a física depende. Portanto, a física não pode nos dizer sobre a origem de todas as coisas físicas, o que levaria a uma esfera extrafísica fora de sua própria esfera de competência.A incrível ingenuidade e ignorância de Hawking acerca da natureza da filosofia e sua relação com as ciências naturais ficam evidentes quando se lê sua obra "A Brief History of Time" (Uma Breve História do Tempo), que comete disparates vergonhosos sobre Aristóteles, chegando a afirmar que ele negou a validade dos sentidos (ele é famoso por afirmar o contrário). No entanto, a ignorância aparentemente total de Hawking sobre filosofia também o leva a erros surpreendentes em raciocínio, os quais inspirariam pena no leitor se não fosse pelo fato de que ele nunca será obrigado a prestar contas por tais erros.

Hawking e seus simpatizantes querem atribuir o início do universo às leis físicas, enquanto ignoram a questão de sua fonte. Uma lei é um conceito, um princípio, não é uma coisa física. Como é que tais leis existem sem um legislador? Como é que existem conceitos sem uma mente para concebê-los? Nesse caso, onde e como eles existem? Será que estão flutuando por aí no éter dos mitos e fábulas?

Mais problemática é a própria existência de coisas que não existem por sua natureza. Não há nada necessário sobre as leis da física conforme as achamos, nem os objetos físicos de nosso universo e suas propriedades. Podemos conceber de um número infinito de universos possíveis, cada um com seu próprio conjunto de leis, objetos e condições internas. Então, por que é que esse universo existe e não outros? Se outros existem, porque existem em vez de não existirem? Isso é conhecido na filosofia como problema da casualidade, e esse é um problema para o qual a física não consegue nem dar respostas iniciais. As coisas finitas de nosso mundo não existem por alguma necessidade interna. Portanto, elas devem depender de outra coisa para sua existência, e no final das contas todas as coisas devem depender de um ser que existe por sua própria natureza, que existe por si mesmo. Os cristãos, os judeus, os muçulmanos e outros chamam esse ser de Deus.

Outros problemas filosóficos surgem com a crença de Hawking em eventos "espontâneos", sem causa. Embora o princípio de incerteza de Heisenberg, o qual é um elemento fundamental da física quântica, requeira que os cientistas usem teorias de probabilidade e "casualidade" quando criam modelos matemáticos do mundo físico, isso não se converte automaticamente na conclusão de que o mundo é em realidade metafisicamente acidental, sem propósito.

A casualidade é um conceito sem sentido se não tiver uma função de probabilidade pré-existente para defini-la, junto com regras e objetos aos quais se aplica. Além disso, a própria casualidade é só um jeito de se lidar com a falta de conhecimento completo sobre um conjunto de circunstâncias, muito parecido com quando lidamos com um jogo de baralho que foi embaralhado. A ideia de que o mundo poderia ser produto de alguma "casualidade" no princípio e não tem causa fundamental é absurda à primeira vista, e agride violentamente a natureza da própria ciência, que é o estudo das causas e princípios. Se a existência do universo pode ser "casual" e sem causa, então qualquer evento que ocorre dentro dele também pode ser "casual" e sem causa, o que eliminaria completamente a ciência, e a capacidade de entender de forma racional o mundo em que vivemos.

O pensamento de Hawking representa o sintoma típico da arrogância acadêmica que muitas vezes predomina no mundo acadêmico, principalmente entre físicos e outros profissionais das ciências naturais, que se esquecem de que suas respectivas áreas são, afinal, limitadas. As ciências naturais de forma particular parecem atrair grande número de pessoas que se convencem de que só existe a realidade física, apesar do imenso edifício de argumentos que foram levantados contra tal cosmovisão durante mais de 2.300 anos pela filosofia e pela teologia. Eles estão muitas vezes trabalhando sob os tipos mais primitivos de erros filosóficos, principalmente o empirismo, uma doutrina há muito refutada que sobrevive apenas na mente ingênua de cientistas que, se não fosse por esses erros, seriam brilhantes, cuja visão míope do mundo os leva a grandes realizações em seus próprios campos, e ao mesmo tempo os leva ao fracasso total quando tentam responder às grandes perguntas da vida.

Jane Hawking, ex-esposa de Stephen Hawking a quem ele deixou para se casar com sua enfermeira mais jovem, provavelmente explicou melhor quando disse acerca de seu marido: "Stephen tem o sentimento de que pelo fato de que tudo se reduz a uma fórmula racional e matemática, que deve ser a verdade. Ele está investigando profundamente esferas que realmente importam para as pessoas que pensam e que, de um modo, podem ter um efeito muito preocupante sobre as pessoas - e ele não tem competência para isso".

Infelizmente, esse físico brilhante e filósofo incompetente provavelmente terá um efeito muito preocupante em nossa sociedade já confusa, a menos que outros físicos mais responsáveis levantem a voz. Vamos esperar que o façam.



Tradução: Julio Severo

Fonte: http://noticiasprofamilia.blogspot.com

Veja também este artigo original em inglês: http://www.lifesite.net/ldn/viewonsite.html?articleid=10090704

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Vício consagrado

Por Olavo de Carvalho | 28 Junho 2010


RESUMO: O grosso do público não tem a mais mínima idéia das técnicas de engenharia social que, de uns trinta anos para cá, se substituíram maciçamente às normas do bom jornalismo.


A afetação de neutralidade superior, especialmente quando se quer impingir à platéia opiniões arriscadas e mentiras cínicas, é a essência mesma do "estilo jornalístico". Os "grandes jornais" deste país praticam-no com destreza tal que a maior parte de seus leitores, tomando a forma pelo conteúdo, acredita seguir a razão e o equilíbrio no instante mesmo em que vai se acomodando, pouco a pouco, anestesicamente, às propostas mais dementes, às modas mais escandalosas, às idéias mais estapafúrdias.

Quando a Folha, quase vinte anos atrás, começou a promover discretamente o gayzismo sob a inócua desculpa mercadológica de que os gays eram também parte do público consumidor, quem, entre os leitores, poderia imaginar que com o decurso do tempo essa gentil atenção concedida a uma faixa do mercado se converteria numa estratégia global de imposição do homossexualismo como conduta superior, inatacável, sacrossanta, só rejeitada por fanáticos e criminosos? Quem, aliás, tem a paciência e os meios intelectuais de examinar as mudanças progressivas e sutis da linguagem de um jornal ao longo de vinte anos? No começo, o processo é invisível porque seus primeiros passos são discretos e aparentemente inofensivos. No fim, é invisível porque sua história se apagou da memória popular. A lentidão perseverante é a fórmula mágica das revoluções culturais.

É verdade que o grosso do público não tem a mais mínima idéia das técnicas de engenharia social que, de uns trinta anos para cá, se substituíram maciçamente às normas do bom jornalismo. Não há uma só faculdade de jornalismo no Brasil que tenha escapado à influência das doutrinas "desconstrucionistas", segundo as quais não existe verdade objetiva, nem fato, nem relato fidedigno - há apenas a "vontade de poder" e, conseqüentemente, a "imposição de narrativas". Notem bem: não se trata de impor "opiniões", julgamentos de valor. Trata-se de modelar a seqüência, a ordem e o sentido dos episódios narrados, de tal modo que sua simples leitura já imponha uma conclusão valorativa sem que esta precise ser defendida explicitamente. É a arte de fazer a vítima aceitar passivamente, de maneira mais ou menos inconsciente, opiniões com as quais, numa discussão aberta, jamais concordaria. Antigamente os jornais buscavam ser neutros e objetivos nas páginas noticiosas, despejando nas seções editoriais as opiniões candentes, a retórica exaltada, as campanhas empolgantes. Hoje os editoriais são todos escritos num mesmo estilo insosso, diplomático, sem cor nem sabor, porque as opiniões que se deseja impingir ao público já vêm embutidas no noticiário, onde gozam do privilégio - e da eficácia - dos ataques camuflados. No Brasil, todo estudante de jornalismo, mesmo quando incapaz de conjugar um verbo ou atinar com uma regência pronominal, sai da faculdade afiadíssimo nessa arte. Não porque a tenha "estudado" - o que suporia uma discussão crítica incompatível com a natureza mesma dessa prática --, mas justamente porque teve de exercê-la para passar de ano, sem discuti-la, de tal modo que seu sucesso escolar depende de sua docilidade em consentir com o embuste até o ponto em que deixe de percebê-lo como embuste. Então ele está pronto para usá-lo contra os leitores sem ter qualquer suspeita de estar lhes fazendo algum mal.

É por isso que a "grande mídia", hoje em dia, já não vale absolutamente nada como forte de informação, e continuar a consumi-la como tal é apenas um vício consagrado, fundado no prestígio residual de um jornalismo extinto.



Disponível em: http://www.midiasemmascara.org/artigos/desinformacao/11187-vicio-consagrado.html

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Liberdade religiosa versus liberdade de expressão: Um conflito meramente aparente

POR BELCORÍGENES DE SOUZA SAMPAIO JÚNIOR


(Disponível também em JUSNAVIGAND: http://jus.uol.com.br/revista/texto/17660/liberdade-religiosa-versus-liberdade-de-expressao)




RESUMO: É intolerante quem defende e afirma publicamente as suas convicções políticas, ideológicas ou religiosas? Deve o Estado se imiscuir nestas questões?



INTRODUÇÃO

A busca da liberdade (em sentido amplo) tem sido o âmago da questão dos movimentos históricos em prol da elevação do Ser Humano, sendo a autodeterminação o vértice dos movimentos sociais em prol dos chamados Direitos Humanos Fundamentais. A ânsia por se libertar da tirania e da opressão vicejou profundamente e com tal intensidade, que revoluções foram engendradas, países fundados, continentes conquistados e, infelizmente, milhões de vidas ceifadas. O estatuto das liberdades públicas, tal como hoje é concebido no âmbito das declarações de direitos humanos, foi solidificado com o sangue de milhões de mártires, vítimas da luta contra a dominação do corpo da alma e do espírito.

O termo LIBERDADE sendo um vocábulo análogo, pode significar a manifestação apenas de uma forma de liberdade, como a liberdade de locomoção, por exemplo, ou pode significar o conjunto das liberdades tuteladas pelos diversos estatutos de direitos humanos. De ordinário, esta última significação se faz presente quando o vocábulo é utilizado no plural: LIBERDADES. Podemos estabelecer então que em um sentido estrito a palavra LIBERDADE significa a expressão jurídica de alguma das formas de liberdade, e em sentido lato LIBERDADE significa um complexo instituto jurídico que possui como fundamentação a própria natureza humana.

Quanto à questão cognitivo-sociológica do ser humano, concordamos que as influências externas sobre o indivíduo modelam o seu material sensório e, com isto, podem ditar-lhe a conduta. Ser livre, neste contexto, significa apenas manobrar dentro do curto espaço das escolhas (e das possibilidades) limitadas. Mais isto não é pouco. É exatamente sobre o mundo das "escolhas", das idéias e dos valores que nos restam que projetamos a nossa identidade cultural. É este o espaço que precisa estar a salvo da ação do Estado e da sua interferência.

É certo que não cabe ao Estado laico promover os valores da religião. Tal idéia libertária, oriunda da revolução francesa, procurou definir os espaços próprios da ação de cada poder: o poder político e o poder religioso. Tal contribuição propiciou o fortalecimento da liberdade religiosa, com a proliferação de religiões e seitas em um ambiente livre da perseguição e da prevalência de uma religião oficial.

Paralelamente, livre das guias da igreja e com o advento da evolução cientifica, industrial e tecnológica, um novo homo-saber anti-religioso forjou-se no seio da sociedade. Também a revolução dos costumes, na década de 60, e bem assim, os humores da globalização, informam este ser humano do novo milênio, desprovido dos valores religiosos que por séculos espelharam o mundo ocidental.

Não obstante, e talvez seja adequado dizer que agora no papel de "contracorrente", os movimentos e grupos religiosos continuam a crescer. Os choques entre as duas cosmovisões são inevitáveis. São embates ideológicos, cabendo a cada grupo exercitar as suas liberdades de crença, convicção e expressão. A falta de uma visão equilibrada desta pluralidade ideológica, notadamente nos Estados com governos intitulados "progressistas", tem sido fonte de problemas.

Alguns destes Estados constitucionais, inclusive a Espanha e o Brasil, têm incorporado em suas políticas públicas determinados valores ideológicos visceralmente contrários aos valores religiosos Nestes casos é comum a alegação de que se está implantando o "laicismo" na sociedade". Ora, isto é uma mera falácia. Nunca a idéia de um Estado laico significou o combate à religião alguma. Estado laico é apenas o Estado separado da Igreja no plano político.

Estes são tópicos que precisamos detalhar, pois para muitos operadores do direito as respostas ainda não estão claras, e o exame envolve responder a algumas perguntas, por exemplo: pode ser classificado como intolerante quem defende e afirma publicamente as suas convicções políticas, ideológicas ou religiosas? Ou intolerante é quem não aceita que as suas convicções sejam publicamente contrariadas? Deve o Estado se imiscuir nestas questões? Existe um limite constitucional para estas ações?


1- LIBERDADES PÚBLICAS

Contrariamente ao que apregoa boa parte da doutrina, todas as liberdades podem ser consideradas como publicas tendo em vista que a intervenção do aparato estatal é sempre necessária, inclusive desde o ponto de vista legislativo, para a plena efetivação das liberdades.

As liberdades públicas operam, no âmbito jurídico, dentro de uma estrutura normativa legal. Trata-se de uma espécie de poder que o Estado confere aos indivíduos: poder de autodeterminação. A liberdade é um poder/dever que cada ser humano exerce sobre si mesmo, e trata-se de uma obrigação negativa, ao contrário da maioria dos outros direitos, ou seja, em seara da liberdade, o meu dever é apenas respeitar, pela abstenção, a liberdade dos outros.

Muitas questões ainda podem ser suscitadas nestes aspectos. É muito conhecida a noção de liberdade negativa e liberdade positiva, o que alguma confusão pode fazer.

ISAIAH BERLIN, afirma que a liberdade negativa significa não ser impedido pelos outros de fazer o que se deseja fazer : "yo soy libre em la medida em que ningún hombre ni ningún grupo de hombres interfieren en mi actividade (...) yo no soy libre en la medida en que otros me impiden hacer lo que yo podría hacer si no me lo impedieran" 1

Quanto à liberdade positiva preleciona: "el sentido ‘positivo’ de la palabra ‘libertad’ se deriva del deseo por parte del individuo de ser su próprio dueño (...) quiero ser el instrumento de mí mismo y no de los actos de voluntad de otros hombres". 2


2 - LIBERDADES DA PESSOA INTELECTUAL E MORAL

Sabemos que pelos usuais critérios de classificação, são constituídas pelas chamadas liberdades de pensamento, também denominadas pelos progressistas como liberdades éticas, e abrangem os aspectos subjetivos da personalidade e da consciência humana que viabilizam a liberdade de eleição. Dentre elas podemos destacar: liberdade de opinião; liberdade de consciência liberdade religiosa; liberdade de crença; liberdade de culto; liberdade de expressão.


3 - A POSIÇÃO CONSTITUCIONAL DAS LIBERDADES.

De maneira geral, em todos os Estados Constitucionais e Democráticos de Direito as liberdades, atualmente, possuem um status constitucional de princípios fundamentais. Não é de outra maneira na Constituição de 1978 na Espanha e também na Constituição de 1988 no Brasil. Ambas refletem o teor da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, da Organização das Nações Unidas, sendo desnecessário aqui, nesta breve reflexão, maiores delongas sobre esta citada condição já amplamente solidificada nas melhores doutrinas sobre o tema.

3.1 - A LIBERDADE RELIGIOSA NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

O lento maturar dos chamados direitos humanos perpassa toda a história da humanidade. Nestes cenários áridos da construção permanente da cultura das sociedades, a liberdade religiosa ocupa papel de reconhecida importância no atual Estado Democrático de Direito. A imanência da liberdade de pensamento permitiu aos indivíduos de diferentes culturas que se desenvolvessem no caminho da contemplação e/ou revelação religiosa. E cada coletividade definiu suas práticas, ritos, cortejos, ídolos e invocações. Por fim, servos, senhores, ricos, pobres, letrados e leigos se encontraram todos nos umbrais da elevação místico-religiosa.

3.2 - A DIMENSÃO ONTOLÓGICA DO DIREITO À LIBERDADE RELIGIOSA.

A liberdade religiosa esta fincada entre as liberdades de pensamento. Enquanto direito fundamental, é a mais complexa das liberdades públicas, pois se volta para verdades imateriais de cunho transcendental, sendo intrinsecamente multi-facetária. Bem assim, carrega ontologicamente consigo as demais espécies ou formas de liberdade: a liberdade de manifestação do pensamento, a liberdade de crença, a liberdade ideológica, a liberdade de opinião, a liberdade de expressão, a liberdade de reunião, dentre outras.

Assim, e correto afirmar que a liberdade religiosa, como pressuposto lógico e fundamental do seu exercício e da sua efetivação no Estado democrático de direito, abriga diversas outras liberdades, sem as quais seria mera simulação normativa. Neste sentido, não se pode conceber liberdade religiosa sem liberdade de manifestação do pensamento, ou liberdade religiosa sem liberdade de expressão. Tampouco liberdade religiosa sem liberdade de reunião. Como dissociar liberdade religiosa de liberdade de consciência? Como dissociar liberdade religiosa de liberdade ideológica? A obviedade de tais associações inviabiliza qualquer tentativa de cindi-las.

3.3 A LIBERDADE DE EXPRESSÃO RELIGIOSA

Como afirmamos, a liberdade religiosa, como liberdade de pensamento que é, está umbilicalmente ligada à liberdade de expressão. Não parece ter fundamento a considerável confusão quanto a este ponto. Sem embargo de não existir um critério rígido de classificação das liberdades, é crível que as liberdades de pensamento, ou liberdades éticas, não encontram sua efetivação no momento em que surgem na tela sensorial da mente, pois este é um mero ato reflexo, mas sim no exato instante da sua exteriorização.

A Liberdade religiosa não indica apenas a simples possibilidade da existência de um pensamento encapsulado na mente do indivíduo, e afastado o imponderável evento de uma religião cuja máxima seja "só pensar por pensar", o natural é que a exercício autêntico da religião, como o exercício de tantas outras coisas na vida, contenha e abranja discursos e ações.


4 - UM CONFLITO MERAMENTE APARENTE

O conflito aparente entre as duas formas de liberdade - Liberdade Religiosa e Liberdade de Expressão - se manifesta, aos olhos menos atentos, quando existe um conflito de opiniões entre duas doutrinas com visões antagônicas. Ao usar o seu direito à liberdade ideológico-religiosa, combinado com o seu direito a propalar a sinceridade dos seus pensamentos, consistente na liberdade de expressão (parte integrante da liberdade religiosa), algumas pessoas e grupos podem ser hostilizados com base na falsa premissa de que são intolerantes.

A título de exemplo, podemos imaginar o fiel de uma religião hipotética com as seguintes características doutrinárias:

a)Monoteísta: acredita somente na existência de um único Deus;

b)Transcendente: acredita que Deus está fora do plano material;

c)Salvadora: todos estão perdidos e precisam de salvação;

d)Universal: as verdades do que crêem são para todos os seres humanos;

A questão aqui é saber se, em essência, tal religião e seus seguidores são intolerantes quando defendem as suas convicções: a resposta claramente é negativa. Obviamente ao afirmar as verdades, que integram sua estrutura de consciência e de valores, o fiel desta religião hipotética estará negando as outras possibilidades. Isso, contudo, não autoriza ninguém a pensar que aqueles que são politeístas, ateus, etc., estariam sendo vítimas de intolerância ou discurso ódio de qualquer espécie tão só porque confrontados publicamente com as convicções do fiel desta religião hipotética. E aqui não se aplica a regra da vontade da maioria, nem da conservação de direitos de minorias, pois o que prepondera, neste caso, é o direito fundamental da liberdade de expressão religiosa e ideológica.

Assim, não se pode alegar que o fiel de uma fé religiosa, seja ela qual for, é intolerante porque sua doutrina religiosa não inclui a opção de aceitar como verdade a teoria oposta. Tal situação tocaria o absurdo e seria um equívoco cometido contra a lógica e contra o fato mesmo da irredutibilidade de opiniões.


5- LIBERDADE RELIGIOSA COMO TOLERÂNCIA À OPINIÃO DIVERSA

Tolerância pode ser definida como a aptidão para a convivência de crenças e opiniões diversas. A idéia de tolerância tem seu campo de ação mais importante no campo religioso e, automaticamente, da liberdade de consciência. Podemos nos referir a dois tipos básicos de tolerância: tolerância frente a crenças e opiniões religiosas e políticas diversas; e a tolerância frente às minorias étnicas, raciais, físicas, homossexuais etc.

Isto nos situa frente às livres e legítimas manifestações do pensamento dentro de um Estado Constitucional de Direito. Tais divergências derivam da liberdade de pensamento, exteriorizadas na convicção de possuir a verdade, seja ela política, ideológica ou religiosa.

O que importa aqui é fixar como podem ser compatíveis, teórica e praticamente, duas "verdades", ou convicções, opostas. A resposta é que, sob pena de se cair no vazio inaceitável de se tentar impor limitações ao livre exercício do pensamento e na tirania de combater o direito de livre manifestação do mesmo, só resta aceitar com tranqüilidade o fato de cada ser humano tem o direito de pensar, crer e se expressar livremente, conforme a sua convicção e consciência.

A liberdade religiosa pressupõe então o direito de crer e o direito de afirmar publicamente aquilo que se crê, mesmo que esta cosmovisão contrarie a opinião, a ideologia ou até mesmo a religião alheia. Em outras palavras, o direito à liberdade religiosa, e ideológica, garante a possibilidade de se crer no que quer que seja, e de afirmar publicamente aquilo que em que se crê.

A liberdade religiosa só existe de fato quando se assegura este seu aspecto externo e público. Porque a religião num contexto internalizado, em forma de pura reflexão, não necessita de qualquer tipo de garantia do Estado. Em mero pensamento sempre há liberdade. Por este motivo, o que a garantia de liberdade religiosa pretende assegurar é a possibilidade de o fiel viver e dizer, com liberdade, de acordo com o que acredita.

Acrescente-se que, por ser direito fundamental, a liberdade religiosa não deve ceder a princípios menores. Aqui não tem aplicação um princípio de "boa vizinhança ideológica". Nem é aceitável qualquer imposição para que o indivíduo deixe pensar o que pensa, com o fito de tornar sua crença mais "aceitável" ou diminuir eventuais contrastes de opiniões, pois isto equivaleria a negar a sua liberdade e empobrecer o debate ideológico.

5.1 - A LIBERDADE FRENTE À CONFRONTAÇÃO E A PROVOCAÇÃO IDEOLÓGICA

Alguns autores entendem que em um Estado democrático é possível contestar, frontal e severamente, qualquer ideologia, inclusive a religiosa, tudo perfeitamente embarcado pela liberdade de expressão. Tal posição é legítima, porém precisa ser mais bem discutida para não se descambe para a mera afronta e violência gratuita. Geralmente seus defensores se dizem representantes de algum tipo de progressismo, secularismo, ou laicismo:

"(...) pues bien, las ideologías, los sistemas de convicciones y de creencias, religiosos o no religiosos, no merecen el más mínimo respeto. desde las conquistas de la libertad de conciencia, de pensamiento, de expresión, el destino más digno de cualquier sistema de ideas y creencias es ser sometido a todas las operaciones de pensamiento que seamos capaces de realizar con él, desde su exaltación a la más completa burla, al escarnio y a la irreverencia..." 3

Ou em outra reveladora versão:

"(...) pessoas merecem respeito. idéias não. (...) como o leitor já deve ter concluído, faço objeções fortes a teses religiosas, mas elas não se confundem com ataques a pessoas religiosas. (...) façam suas escolhas. só o que não vale é tentar calar o adversário." 4

Entendemos aceitáveis estes "ataques". Enquanto os mesmos permanecerem no plano da contestação ideológica de uma determinada convicção política ou crença religiosa, é viável concordar que tal postura estará ancorada pelo direito à liberdade de expressão. Sem embargo, quando o discurso atacar a integridade moral ou pessoal de qualquer indivíduo (ou instituição), desqualificando-o pelo fato da sua ideologia, estaremos incorrendo em uma postura discriminatória e odiosa, a merecer rechaço.

Acredito que o melhor exemplo sobre o assunto seja o constante "patrulhamento pejorativo" que os "crentes" recebem neste atual ambiente mundano secularizado, e que se diz "evoluído". Ora, evoluir é perceber a inexorável amplitude da condição humana e encarar como normal as divergentes opções e identidades culturais (pacíficas) eleitas para si por cada indivíduo livre, e não o seu contrário. Julgar o seguidor de determinada doutrina como inferior (intelectual ou moralmente) é incidir na infamante e antijurídica prepotência de acreditar-se signatário das melhores escolhas e de maiores direitos, o que por si só é abjeto.

Neste ambiente, é necessário também que se esclareça disparatado querer emparedar a liberdade religiosa proibindo a divulgação de suas idéias ou a prática de seus cultos. O raciocínio é o mesmo quanto à idéia de querer obrigar a adesão a um culto ou ideologia qualquer. Dizendo de outra forma, a liberdade religiosa não existe só para assegurar a prática religiosa, mas também para respaldar a possibilidade de o sujeito não ter religião. Ela afiança a possibilidade de um ateu dizer, publicamente, que não acredita na existência de Deus, ou duvidar que Ele seja bom, etc, sem que por isso seja considerado intolerante.

Se for verdade que a liberdade de expressão religiosa ou ideológica não constituem um direito absoluto, também é verdade que estas só devem encontrar limites em casos muitos específicos (como as questões que envolvem, por exemplo, segredos militares).

Por outro lado, devemos concordar que a garantia da liberdade de expressão apesar de criar um direito a "dizer o que pensa", não abriga um "direito a ser ouvido" nem a uma "obrigação de ouvir". Uma postura que pretenda instituir a "obrigação de ouvir", não seria compatível com um Estado de direito. Uma normatização deste quilate só poderia ser bosquejada em Estados totalitários (talvez o exemplo mais inconfundível seja o do eterno comandante Fidel Castro, em Cuba), mas, fora isso, ninguém pode ser obrigado, nem pelo Estado nem por particulares, a ‘ouvir’ ou deixar de ouvir, seguir ou deixar de seguir doutrina alguma.



6- LIBERDADE DE EXPRESSÃO E A IGUALDADE

Há quem argumente que certas manifestações da liberdade de expressão podem ferir o princípio da igualdade. Entendem que a divulgação de algumas opiniões específicas podem vulnerar grupos menos privilegiados e contribuir para o aumento da desigualdade. Esta corrente fomenta a idéia de que algumas pessoas não devem ser livres para expressar as suas opiniões e preferências.

Equivocadamente, se toma como parâmetro para esta "censura" algumas normas a respeito de assédio sexual e discriminação no ambiente de estudo ou de trabalho. Mas é fácil ver que não trata da mesma coisa. O assédio sexual e a discriminação negativa são condutas que efetivamente merecem reprovação. Mas este pensamento legítimo nunca pode estribar a falsa idéia de que necessário desinfetar o mundo para criar um espaço asséptico para abrigar "grupos minoritários que se julgam alvo de manifestações e expressões que ‘reputam’ ofensivas".

Tal situação seria um retorno a um tempo das "trevas" da ignorância jurídico-política. Na prática, pressupõe a criação de uma espécie de "POLÍCIA IDEOLÓGICA" e, quem sabe, de uma "CENSURA PRÉVIA" em textos e falas. Neste diapasão, seria necessário e conveniente, quem sabe, estabelecer também "TRIBUNAIS CULTURAIS" para julgar as demandas apresentadas pelos "FISCAIS CULTURAIS", o que, verdadeiramente, é um insondável absurdo.

"O Estado poderia então proibir a expressão vívida, visceral ou emotiva de qualquer opinião ou convicção que tivesse uma possibilidade razoável de ofender um grupo menos privilegiado. poderia por na ilegalidade a apresentação da peça o mercador de veneza, os filmes sobre mulheres que trabalham fora e não cuidam direito dos filhos e as caricaturas ou paródias de homossexuais nos shows de comediantes. os tribunais teriam de pesar o valor dessas formas de expressão, enquanto contribuições culturais ou políticas, contra os danos que poderiam causar ao status ou à sensibilidade dos grupos atingidos." 5

É preciso sempre muita atenção para não caiamos no erro de acreditar que os institutos da liberdade e da igualdade estão em lados opostos. Na verdade, ambos se complementam na luta pela efetivação dos direitos fundamentais da humanidade. Não existe o tal propalado conflito entre a liberdade e a igualdade, e mesmo se existisse teríamos que fazer a opção pela liberdade, pois o entendimento contrário nos levaria a justificar a existência de um Estado controlador, o que seria uma grave agressão à própria noção de direitos fundamentais, que são exatamente aqueles direitos que os particulares exercem contra o Estado e contra terceiros, e que pertencem à órbita de ação do indivíduo, dentro da eficácia vertical e horizontal dos mesmos.

O ambiente social e político de uma sociedade é plural. E exatamente esta riqueza, ou "mercado de idéias", que faz prosperar as diferenças, e não seu contrário. O direito à diferença e o direito á manifestação está intimamente ligada à própria noção de igualdade, cidadania e representação.


7- LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DIVERSIDADE

Uma sociedade ideologicamente plural deve admitir a existência de diversas manifestações divergentes na sociedade. Quando um Estado que se diz democrático resolve intervir indevidamente no processo natural de harmonização das diferenças, surge sempre um problema. É que não compete ao Estado selecionar quais manifestações e valores poderão prosperar e quais não. A complexidade do corpo social exige distanciamento do Estado das ideologias particulares dos seus cidadãos, concretizando assim os ideais de liberdade.

Uma coisa é o direito à manifestação ou expressão do pensamento, e outra bem diferente é supor que alguém, ou algum grupo tenha o direito de impor a sua visão, ou os seus valores, à sociedade, sob a tutela do Estado. Assim como não existe um direito geral a "aceitação" das idéias, não existirá obviamente um direito a "imposição" de uma idéia ou valor qualquer. As idéias devem se confrontar no plano das idéias e não na trincheira do direito ou na ameaça da sanção oficial por parte de um Estado que se pretenda minimamente democrático.

Podemos exemplificar esta questão com a seguinte hipótese: um determinado Estado resolve proibir, através de uma sanção penal ou civil, que a doutrina "A" (religiosa, moral ou política) seja defendida ou professada, pelo motivo desta entrar em confronto direto com os postulados da doutrina "B". Se agir assim, este Estado comete dois erros:

-1º Viola o direito a liberdade religiosa, ideológica ou liberdade de expressão das pessoas que se filiam à doutrina "A";

-2º Sendo laico e democrático, se desnatura ao promover e afirmar oficialmente a doutrina "B".


8- LIBERDADE DE EXPRESSÃO, IDENTIDADE E CONFORMAÇÃO

A identidade do indivíduo é inferida sempre a partir de critérios de semelhança e comparação. Geralmente é definida como a expressão da sua semelhança com algo que seja emblemático enquanto paradigma. Ou seja, para falarmos em identidade do indivíduo precisamos saber as características singulares do mesmo para então comparar com os demais modelos existentes e estabelecer as diferenciações e semelhanças, que definem quem ele é, e porque ele é o que é. O mesmo vale para os diversos grupos sociais.

Assim, é possível conceber a liberdade de expressão como manifestação da personalidade e, portanto, componente mesmo da identidade individual.

O segundo sentido da palavra reconhecimento, que é o de identificação, serve para dizer que alguém foi "reconhecido em meio a uma multidão", ou seja, foi identificado. E na política de reconhecimento deve ser entendido como a atitude de particularizar um indivíduo, percebendo-o em sua singularidade. Avulta a idéia de que cada indivíduo é diferenciado, e o mérito de ser diferenciado é o valor inerente da autenticidade.

Desta maneira, há que se pensar a liberdade de expressão como garantia de que o indivíduo seja reconhecido por seus méritos (valorização) e por sua diferença (identificação). E a identificação, como vertente da política de reconhecimento, se inclina para personalidade do indivíduo, e não apenas para a sua pessoa. Não se reconhece (identifica) o sujeito por ser quem é (sua identidade pessoal), mas por ser como é (sua personalidade). É como quando se diz, ao observar uma pintura ou ler um livro, que, devido às suas peculiaridades, é possível reconhecer (identificar) o seu autor.

Um outro aspecto da questão é a moderna compreensão de que cada ser humano tem a sua própria expressão de personalidade única e inigualável. Isto amplia a noção de identidade enquanto grupo religioso, ou social. Dizendo de outra forma. No caso da questão religiosa, por exemplo, duas pessoas não crêem sempre da mesma maneira ou na mesma intensidade e isto vai decorrer que a expressão de fé de cada uma vai ser sempre diferente. Tal dimensão também deve ser contemplada pelas liberdades, de uma maneira geral.

A aplicação prática deste pensamento pode ser visualizada com relação à idéia de identidade religiosa. Ou, em palavras melhores, da ligação do indivíduo com a idéia da existência ou não da divindade e todos os consectários desta relação.

Por muitos motivos, o modo através da qual o indivíduo se porta frente ao sagrado, é algo que não se pode ou consegue afastar da personalidade. É um dos fundamentos da personalidade. Neste compasso, é necessário que a política de reconhecimento caminhe de mãos dadas com a liberdade de expressão, garantindo ao fiel, no exercício de sua crença, afirmar e viver de acordo com o seu credo, constitutivo que é da sua própria identidade e decorrente da sua autonomia e dignidade.

Sabendo que todo ser humano, independentemente de ser diferente, ou não, do seu ambiente social, tem os mesmos direitos que os demais, implica concluir que para o universo jurídico tais diferenças ideológicas devem ser insignificantes. Assim, se o fiel de uma fé religiosa qualquer se veste de maneira atípica com os padrões seculares da moda e sofre opressão ou discriminação social por causa disto, estará sofrendo um verdadeiro atentado à sua liberdade cultural e religiosa, que lhe garante o direito de ser e se expressar de acordo com as suas convicções.

"Podemos hablar de una identidad individualizada, que es particularmente mia, y que yo descubro em mi mismo. este concepto surge junto con el ideal de ser fiel a mi mismo ya mi particular modo de ser(...) hay cierto modo de ser humano que es mi modo. he sido llamado a vivir, mi vida de esta manera, y no para imitar la vida de ningún outro (...) si no me soy fiel, estoy desviándome de mi vida, estoy perdiendo de vista lo que es para mi el ser humano(...) la importancia de este contacto próprio aumente considerablemente quando se introduce el principio de originalidad: cada uma de nuestras vocês tiene algo único que decir(...) ser fiel a mí mismo significa ser fiel a mi propria originalidade, que es algo que sólo yo puedo articular e descubrir" 6

De toda forma, uma coisa é um grupo tentar impedir POR MEIOS NÃO DEMOCRÁTICOS a legalização de uma prática qualquer. Isto caracterizaria uma violação, não apenas da dignidade humana, mais do próprio Estado democrático. Outra coisa bem diferente é este grupo, DENTRO DO PRÓPRIO JOGO DEMOCRÁTICO, onde todos podem expressar as suas convicções e trabalhar por elas, realizar o combate ideológico ou a defesa das suas convicções e valores.

Este exercício de democracia não pode ser tomado como atentatório da dignidade humana. Atentatório seria tentar emudecer a expressão daqueles que quiserem exercer este legítimo direito. Sob esta ótica não se pode negar que ser partidário da "dignidade humana", muitas vezes significa somente uma questão de ponto de vista, dentro do espaço da livre reflexão autonômica dos indivíduos que estejam em lados opostos, em um debate ideológico.


9 - ESTADO LAICO E LIBERDADE RELIGIOSA

A expressão estada laico é deveras paradoxal, pois ela indica que a religião não ocupa um patamar especial na sociedade, o que por si só já é discriminatório porque pressupõe um Estado separado apenas dos valores éticos da religião. Se todas as liberdades da pessoa intelectual e moral, inclusive a liberdade religiosa, são liberdades éticas, promover ou rechaçar apenas uma delas é uma forma clara de discriminação. Não faz sentido que o Estado deva ficar desmamado apenas dos valores da religião.

É preciso cuidar para que o discurso de igualdade das chamadas "liberdades éticas" não se converta em discriminação da liberdade religiosa. Seria um total paradoxo entender que as liberdades éticas são iguais em importância mais que o Estado só deve estar separado dos valores da religião. É este o absurdo jurídico que propõe alguns chamados "juristas progressistas?" Prefiro acreditar que não.

Assim, a liberdade sexual, a liberdade de matrimônio, a liberdade de procriação e a liberdade religiosa são apenas uns feixes da liberdade ética e um Estado Democrático de Direito deve se manter distanciado da promoção de qualquer uma delas. A expressão Estado Laico deve, portanto, ter o alcance hermenêutico de Estado Neutro.

9.1 - O LAICISMO COMO A "NOVA RELIGIÃO" DO ESTADO

"O Estado leigo, quando corretamente percebido, não professa, pois, uma ideologia "laicista", se com isto entendemos uma ideologia irreligiosa ou anti-religiosa(...) enfim, visto que não defende somente a separação política e jurídica entre estado e igreja, mas também os direitos individuais de liberdade em relação a ambos, o laicismo se revela incompatível com todo e qualquer regime que pretenda impor aos cidadãos, não apenas uma religião de estado, mas também uma irreligião de estado." 7

O papel do Estado laico não é promover uma liberdade ética em detrimento de outra. Por certo, partindo do correto pressuposto de que todas elas estão em um mesmo patamar jurídico não deve promover liberdade ética alguma. A correta atitude por parte do Estado em relação às liberdades éticas em geral é garantir seu livre exercício, sem apontar caminhos ou legislar para demonstrar predileções. Como a bem resume a famosa frase de NORBERTO BOBBIO: "el laicismo que necesite armarse y organizarse corre el riesgo de convertirse en una iglesia enfrentada a las demás iglesias".

Um Estado Constitucional de direito não pode eleger objetivos que se sobreponham aos direitos fundamentais de seus cidadãos. Não pode, por exemplo, por em prática uma política de "suavização" da fé religiosa, visando torná-la menos categórica, seja qual for a religião ou doutrina. No Estado de Direito todos estão legitimamente autorizados a ter e a afirmar as suas legítimas convicções. Qualquer tentativa de boicotar este exercício é um verdadeiro atentado aos direitos humanos fundamentais.

É urgente resgatar, no plano de nossa ação prática, a universalmente conhecida máxima de Voltaire: "sou contra tudo o que vossa senhoria disse, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo".


CONCLUSÃO

Defender a liberdade é mais do que necessário é libertador, pois historicamente o entorno desta luta tem removido montanhas de opressão, preconceitos e discriminação.

Temos que ter em mente que o seguidor de determinada doutrina particular ou um fiel religioso possuem uma postura diferenciada com relação aos fatos e eventos da vida, o que para a racionalidade leiga pode não fazer qualquer sentido, sendo normal tal conflito. São dilemas de lógicas e ordens diferentes.

A liberdade religiosa, por exemplo, flui da nossa própria condição de seres humanos, e cabe ao Estado garanti-la e jamais violá-la. A despeito disso, não raro surgem pseudo-políticas que avançam sobre estes direitos basilares. A ingerência dos poderes públicos no âmbito da fé dos indivíduos tem adquirido, no Brasil e na Espanha, status de nova fé pública. Vivemos, ultimamente, em verdadeiros Estados "LAICIZISTAS", entendendo-se esta expressão como denotadora da manifestação de uma doutrina de aniquilação dos valores da religião e a introdução e afirmação de uma sociedade "livre" da influência da fé religiosa.

O Estado, e os seus representantes, estribados quase sempre em falsas premissas, não podem tentar blindar, proibir ou privilegiar, ideologia, religião, raça ou cultura alguma contra o confronto e o embate salutar das idéias.

Neste contexto é viável afirmar que uma coisa é a prática do crime de racismo, que é abjeto e inaceitável, outra coisa bem diferente é vincular a crítica à religião africana, por exemplo, como crítica à raça. A crítica à ideologia e à religião qualquer é lícita. Tem como campo de atuação o âmbito das liberdades de pensamento e da livre circulação das idéias. Diferentemente, a crítica à raça pressupõe um juízo de valor depreciativo ao indivíduo, e isto, corretamente, não deve ser tolerado. O que não se pode aceitar é que o Estado tente confundir as duas situações e com isto se imiscuir e interferir no âmbito das liberdades constitucionais.

Por outro lado, assim como não se pode afirmar que a crítica a religião, ao Estado, ao capitalismo ou ao comunismo seja discriminatória ou demonstre intolerância, sendo apenas um mero exercício da liberdade de pensamento e de expressão, o mesmo raciocínio deve ser legitimamente aplicado, por exemplo, com relação à crítica a ideologia homossexual, ou ao sacrifício ritual de animais, ou à pratica do aborto e da eutanásia, ou a entrega do dízimo,etc, todas estas bandeiras de algumas religiões ou de críticos independentes. Tais críticas são jurídico e filosoficamente legítimas e pensar diferente é, no mínimo, um retrocesso.

Mais infundada ainda é a afirmação de que a eventual crítica à religião de uma minoria é uma forma de discriminação. Ora tal situação no plano das idéias é inconcebível. A tese que a alimenta parte do pressuposto de que algumas pessoas podem sofrer críticas à sua religião e outras pessoas não. Este é um raciocínio hediondo. Outra alegação espúria se refere a um pretenso direito das minorias a ter a sua opção promovida pelo Estado. Tal direito não existe. E é exatamente esta a real medida do pluralismo e da idéia de um Estado democrático.

Vale salientar que o âmbito do que seja a discriminação, inclusive racial, precisa ser urgentemente esclarecido. Ultimamente este termo tem sido levianamente sacado para acusar a qualquer pessoa que se recuse a aceitar a cartilha estatal, e da ONU, para a modelagem das novas convicções ideológicas e religiosas contidas na cartilha da propalada "Nova Era".

As manifestações de ódio e intolerância com relação à diversidade religiosa precisam ser percebidas. Muitas delas são alavancadas por leis flagrantemente inconstitucionais, que anacronicamente dizem pretender eliminar justamente as práticas que acabam consagrando, como atual efusão de leis "anti-discriminação e homofobia" que se prepara no Brasil, ou como os problemas relacionados ao projeto da EPC na Espanha.

É imperativo manter uma postura crítica diante de práticas nitidamente antidemocráticas. Não se pode recorrer à infamante idéia de calar a afirmação doutrinária de um indivíduo ou de uma doutrina ou de uma religião, usando uma interpretação ilegítima da lei, ou mesmo uma "lei espúria" e inconstitucional como ameaça. Devemos estar abertos à crítica e dispostos a compreender a inevitabilidade da divergência.

A tolerância não avança quando a liberdade religiosa e a liberdade de expressão são cerceadas. A tolerância se estabelece no seio social exatamente quando somos livres para divergir e afirmar e defender as nossas próprias convicções e identidade cultural.

Os juizes não devem ser influenciados por nenhuma espécie de ativismo ideológico, cultural ou racial, orquestrado por uma política de laicismo (laicizismo) que incentiva o ódio à afirmação da identidade religiosa para com isto afligir determinadas pessoas e religiões, negando-lhes a liberdade de consciência. Ao contrário, o debate ideológico deve ser incentivado e protegido pelo Estado.

Por fim, há que se reafirmar que no moderno Estado de Direito a proteção constitucional às liberdades inclui na sua esfera de tutela o direito à escolha livre de uma religião ou fé. Bem como o direito de viver de acordo com esta fé. Este é um postulado inexorável dentro do universo jurídico.

A liberdade religiosa é uma derivação natural da liberdade de pensamento. E a liberdade de expressão é seu pressuposto lógico. Sua garantia compõe a base filosófica e jurídica de todo e qualquer Estado democrático. Qualquer restrição indevida ao exercício da liberdade religiosa se configura, em última análise, como uma restrição ao livre exercício do pensamento e como um atentado aos direitos fundamentais.

Pretender simplificar as diferentes crenças a um mínimo comum, sob o argumento da construção de uma paz ideal através da identidade de uma única fé, é em uma abstração utópica. Reduz indevidamente a pluralidade, riqueza e diversidade do pensamento humano Tal devaneio deve ser combatido pela garantia da proteção estatal à manifestação da diversidade religiosa.

Precisamos nos conscientizar da necessidade de cultivarmos uma cultura menos beligerante no tocante aos assuntos da fé e da laicidade. Temos que aprender a divergir e a convergir, com dignidade e com o respeito mútuo que deve caracterizar qualquer debate razoavelmente civilizado Só assim construiremos uma sociedade verdadeiramente democrática, justa e mais humana. A opção oposta equivalerá ao "atirar a primeira pedra."

Por fim, como afirmamos em recente reflexão, intitulada LIBERDADE RELIGIOSA OU ESCRAVIDÃO, Em um Estado Constitucional de Direito, NINGUÉM pode ser obrigado a pautar a sua existência pessoal na fé religiosa ou na crença em doutrina religiosa qualquer. Porém, dentro desta mesma ordem democrática, TODOS estão indelevelmente obrigados a respeitar aqueles que, LIVREMENTE, assim o fazem. Eis ai, em resumo, a essência do que se convencionou chamar de LIBERDADE RELIGIOSA.

Assim, toda espécie de conduta que sugira a batuta de um patrulhamento ideológico/religioso é ilegal, imoral e perversa. Ilegal por ferir gravemente o ordenamento constitucional e os princípios internacionais de direito. Imoral por lançar na indecente lixeira do desrespeito todas as conquistas libertárias durante conquistadas, principalmente, no mundo ocidental. Perversa por constranger, oprimir e infligir desconforto ao crente, ao fiel, ao CIDADÃO que no livre exercício do seu pensamento e da sua consciência, altar maior da liberdade, evocou para si a identidade religiosa na qual se insere no mundo.

Este ser humano que ousou exercer o seu justo direito de viver em conformidade e harmonia com o que pensa e sente não pode, em razão da sua escolha, ser vilipendiado, discriminado, humilhado, preterido e desprestigiado.

Pensar diferente é autorizar o arbítrio sobre terceiros em sede de consciência e ideologia, é permitir a ronda autoritária nas categorias mais profundas da mente humana, é convenir com o patrulhamento ressentido, colérico e antijurídico dos que se sentem acima do BEM e do MAL. É coadunar com as acusações levianas, feitas aos diferentes, de estarem, estes, "aborrecidamente" exercendo o seu jus credere et habere fidem, quando em verdade, a VERDADE mesma, como sabemos, é sempre uma incógnita.

Liberdade para crer ou escravidão ideológico-laicista? Não se trata aqui de uma simples questão de bom senso e sim de uma visão de futuro e cultura que queremos ter e cultivar. Diferente do confronto dialético salutar e respeitoso entre culturas opostas, que deve ser perfeitamente permitido, o assédio ao livre exercício da convicção individual, seja ela religiosa ideológica ou moral, ergue-se à categoria de atentado ao próprio conceito de HUMANIDADE.



Referência:

1 - BERLIN, Isaiah. Dos conceptos de liberdad. Universidad de Chile: www.cfg.uchile.cl, p. 3

2 - BERLIN, Isaiah. Dos conceptos de liberdad. Universidad de Chile: www.cfg.uchile.cl, p. 7

3 – FRANCISCO, juan. laicismo y democracia versus tolerancia y respeto . em http://www.audinex.es/~dariogon/g021.htm - em 31 de julio de 2004.

4 - SCHWARTSMAN, Hélio. Delírios divinos. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/helioschwartsman/ult510u356210.shtml

Em 29 de setembro de 2008.

5 - DWORKIN, Ronald. O direito da Liberdade : a leitura moral da Constituição norte-americana. Trad. M. Brandão Cipolla. São Paulo: Martins Fontes, 2006.

p. 377-378.

6 - TAYLOR, Charles. El multiculturalismo y la la" política del reconocimiento". México, D.F: Fondo de Cultura Econômica, 1993. p. 22,24,25.

7- BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de poliítica.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Íntegra da carta de Dom Bergonzini aos Bispos: "Diante desses fatos, sou obrigado a enviar uma reclamação ao Papa Bento XVI."

Por Luiz Gonzaga Bergonzini
Bispo Diocesano de Guarulhos



Caríssimos irmãos,


Como é de conhecimento de todos, em 01.07.2010, iniciei uma campanha contra os candidatos favoráveis ao aborto, de todos os partidos, a qualquer cargo. O PT - Partido dos Trabalhadores - é o principal articulador dessa ação no Brasil e, também, do "casamento" de homossexuais. Desde 1991, vem tentando implantar o aborto, com o projeto de lei n. 1.135/91, dos então deputados do PT Sandra Starling e Eduardo Jorge. Os Congressos do PT aprovaram a liberação do aborto como programa do partido. O projeto de lei 1935/91 foi derrotado na Comissão de Seguridade e Saúde por 33 a 0 e na Comissão de Constituição e Justiça, dor 57 a 4., na Câmara Federal. O deputado do PT, José Genoino, demonstrando o ferrenho propósito de implantar o aborto, requereu a aprovação do projeto de lei 1935/91 diretamente pelo plenário, onde a bancada de deputados da "base aliada" do governo tem a maioria e pode ser aprovado a qualquer momento. Projeto de Lei n.º 1.151/95, sobre o casamento civil entre homossexuais, foi apresentado por Marta Suplicy em 26 de outubro de 1995, quando ela ocupava a cadeira de deputada federal pelo PT. Iara Bernardes, então deputada federal do PT, apresentou o projeto de lei 122/ 2006, que impede as pessoas e os religiosos de emitirem opinião sobre homossexuais, sob pena de prisão.

O meu comportamento é baseado em minha consciência e no Evangelho. E visa a discussão de valores com a sociedade. Seja qual for o resultado das eleições, filósofos, sociólogos, antropólogos, religiosos e a população já começaram a debater o que chamam de "agenda de valores". O relativismo na sociedade e na Igreja Católica, sempre lembrado pelo Papa Bento XVI, também tem sido questionado: o meu sim é sim e o meu não é não. Não estou me esquecendo dos problemas dos pobres. Para isso, no Brasil, há leis especiais que devem ser cumpridas por qualquer governante. Sem contar a ajuda voluntária dos católicos realizada em todas as paróquias, pelas várias pastorais.

Ocorre que, no dia 07.10.2010, tive uma grande surpresa. Dom Demétrio Valentini, da Diocese de Jales, publicou uma matéria de meia página, no jornal Diário de Guarulhos, editado em minha diocese, com uma acusação de crime eleitoral. Um bispo acusando outro de crime, pela imprensa. É algo muito grave e inadmissível. Anteriormente, recebi uma carta anônima com velada ameaça à minha vida, que já está nas mãos da polícia.

Imaginava ter sido um destempero momentâneo do bispo de Jales. Enviei-lhe uma carta, com cópia ao presidente da CNBB-Regional Sul-1, Dom Nelson Westrupp, reclamando do fato e apontando a suspeita de o bispo de Jales estar atuando partidariamente.

A confirmação da atuação partidária de Dom Demétrio Valentini veio na revista Isto É, pg. 40, edição 2135, de 13.10.2010. Nessa revista está escrito: " A exemplo do pastor Manoel Ferreira, dom Valentim é amigo de Lula, tem exercido papel fundamental no diálogo com os católicos." Além disso, Dom Valentini insiste em que "esta situação precisa ser esclarecida e denunciada" dando a entender que existe qualquer interesse além do Evangelho.

Há igrejas evangélicas no Brasil, cujos pastores são a favor do aborto ou tem interesses políticos, que estão se posicionando partidariamente a favor da candidatura do PT.

Por essas circunstâncias, sou forçado a concluir que: a) a matéria publicada no jornal de Guarulhos teve a mão do Partido dos Trabalhadores e visou me amedrontar; b) a matéria visou, também, assustar os fiéis de minha diocese; c) em âmbito nacional, visou assustar os Bispos e a comunidade cristã e d) parece que há Bispos da Igreja Católica, no Brasil, que estão trocando o Evangelho do Senhor pela política partidária e por amizades pessoais.

O histórico do aborto, desde 1974, pode ser visto no link http://www.youtube.com/watch ?v=4cJZZzWysN4

Dom Aldo Pagotto lembra que situação semelhante à brasileira, com a destruição da moral e da ética, para implantação do comunismo na Itália, somente não aconteceu por conta da atuação do Papa. Dom Aldo historiou os fatos no vídeo postado no link http://www.youtube.com/watch?v=j2q2DI9RsUo

Como lembrou Dom Aldo, na época o Papa disse "Não podemos nos calar." Nós, agora no Brasil, também não podemos nos calar. Vamos agir e orientar o povo para que não se deixe enganar pelos oportunismos de última hora.

Diante desses fatos, sou obrigado a enviar uma reclamação ao Papa Bento XVI, imediatamente, com toda a documentação, pedindo-lhe que tome as providências que julgar cabíveis e necessárias, para reorientar a Igreja Católica Apostólica Romana no Brasil, inclusive me orientar, se eu estiver agindo em desconformidade com o Evangelho.

Quero deixar claro que nunca indiquei apoio a qualquer candidato, como agora não o faço. Estou sendo coerente com meu artigo "Daí a César o que é de César", publicado em 01/07/2010.

Estou comunicando, também, estes fatos todos os irmãos Bispos e Cardeais do Brasil, e a imprensa, através de replicação deste email. A carta a Dom Demétrio Valentim será publicada no site www.diocesedeguarulhos.org.br.

Não tenho intenção de polemizar, mas simplesmente de deixar clara a minha posição como Bispo, em defesa da Igreja, dos mandamentos de Deus.

Rogo a Deus Nosso Senhor (...) que proteja a Igreja Católica e nos proteja a todos.

Guarulhos, 12 de outubro de 2010, dia da Mãe Aparecida.


Luiz Gonzaga Bergonzini
Bispo Diocesano de Guarulhos

terça-feira, 19 de outubro de 2010

SÍNDROME DE BURNOUT: UMA DOENÇA DO TRABALHO

(Em 19/10/2010 - Disponível em: http://www.administradores.com.br/informe-se/informativo/sindrome-de-burnout-uma-doenca-do-trabalho/14280/)



SAIBA MAIS SOBRE UM DISTÚRBIO AINDA POUCO CONHECIDO DA POPULAÇÃO, MAS CADA VEZ MAIS INERENTE AO AMBIENTE DE TRABALHO.


Não há dados sobre a incidência da Síndrome de Burnout no Brasil, mas os consultórios médicos e psicológicos registram um constante aumento do número de pacientes com relatos de sintomas típicos da Síndrome. O problema foi identificado em 1974, nos Estados Unidos, pelo pesquisador Freunderberger, a partir da observação de desgaste no humor e na motivação de profissionais de saúde com os quais trabalhava.

O termo síndrome de Burnout resultou da junção de burn (queima) e out (exterior), caracterizando um tipo de estresse ocupacional, durante o qual a pessoa consome-se física e emocionalmente, resultando em exaustão e em um comportamento agressivo e irritadiço. “Boa parte dos sintomas também é comum em casos de estresse convencional, mas com o acréscimo da desumanização, que se mostra por atitudes negativas e grosseiras em relação às pessoas atendidas no ambiente profissional e que por vezes se estende também aos colegas, amigos e familiares”, explica a psicóloga clínica e hipnoterapeuta ericksoniana Adriana de Araújo.

Segundo a especialista, é bom observar que “o problema é sempre relativo ao mundo do trabalho. É importante ressaltar, que a doença atinge pessoas sem antecedentes psicopatológicos”, afirma. A Síndrome afeta especialmente aqueles profissionais obrigados a manter contato próximo com outros indivíduos e dos quais se espera uma atitude, no mínimo, solidária com a causa alheia. É o caso de médicos, enfermeiros, psicólogos, professores, policiais. “Recentemente, a categoria dos funcionários de companhias aéreas inseriu-se entre aquelas de alto risco para desenvolver a Síndrome, devido às pressões intensas e ao desgaste vivido durante a crise dos atrasos nos horários dos vôos”, exemplifica Adriana de Araújo.

Veja a lista completa das áreas mais estressantes:

1) Tecnologia da Informação;

2) Medicina;

3) Engenharia;

4) Vendas e Marketing;

5) Educação;

6) Finanças;

7) Recursos Humanos;

8) Operações;

9) Produção;

10) Religião.
FONTE: Consultoria SWNS, 2006.



Apesar da associação do distúrbio com o perfil de trabalhadores já mencionados, ele pode afetar executivos e donas de casa também. Em comum, os candidatos à Síndrome apresentam uma personalidade com maior risco para desenvolver Burnout. “Ou seja, são pessoas excessivamente críticas, muito exigentes consigo mesmas e com os outros e que têm maior dificuldade para lidar com situações difíceis”, explica a psicóloga.

A especialista também destaca algumas das características individuais que podem incentivar o estabelecimento da Síndrome: idealismo elevado, excesso de dedicação, alta motivação, perfeccionismo, rigidez. “Em geral, são indivíduos que gostam e se envolvem com o que fazem, não medindo esforços para atingir seus próprios objetivos e os da instituição em que atuam. De certa forma, é tudo o que as organizações esperam de um bom profissional”, conclui. Ou seja, os ambientes corporativos estimulam, de alguma maneira, esse tipo de comportamento entre os profissionais, criando condições que podem predispor ao adoecimento e, na seqüência direta, em licenças médicas e eventuais afastamentos por longos períodos.

Principais características da Síndrome de Burnout:

SINTOMAS EMOCIONAIS: avaliação negativa do desempenho profissional, esgotamento, fracasso, impotência, baixa auto-estima.

MANIFESTAÇÕES FÍSICAS OU TRANSTORNOS PSICOSSOMÁTICOS: fadiga crônica, dores de cabeça, insônia, úlceras digestivas, hipertensão arterial, taquicardia, arritmias, perda de peso, dores musculares e de coluna, alergias, lapsos de memória.

ALTERAÇÕES COMPORTAMENTAIS: maior consumo de café, álcool e remédios, faltas no trabalho, baixo rendimento pessoal, cinismo, impaciência, sentimento de onipotência e também de impotência, incapacidade de concentração, depressão, baixa tolerância à frustração, ímpeto de abandonar o trabalho, comportamento paranóico (tentativa de suicídio) e/ou agressividade.

É preciso deixar claro que a Síndrome de Burnout não deve ser confundida com estresse ou depressão. No primeiro caso, o aparecimento dos sintomas psicossomáticos (dores de cabeça, insônia, gastrite, diarréia, alterações menstruais) sugere muito mais um estresse ocupacional crônico, algo que os estudiosos do assunto definem com tentativa de adaptação a uma situação claramente desconfortável no trabalho.

Em relação à depressão, chegou-se a cogitar uma sobreposição entre Burnout e depressão, no entanto, tratam-se de conceitos distintos. “O que ambos têm em comum é a disforia, o desânimo. Todavia, avaliando-se as manifestações clínicas, encontramos nos depressivos uma maior submissão à letargia e a prevalência aos sentimentos de culpa e derrota, enquanto nas pessoas com Burnout são mais marcantes o desapontamento e a tristeza. A pessoa que vivencia o Burnout identifica o trabalho como desencadeante deste processo”, explica Adriana de Araújo.

Atenção ao ritmo de trabalho

Na realidade, o ritmo acelerado e as tensões no trabalho existentes atualmente, por si só, não desencadeiam a Síndrome. “O desgaste com rotinas extenuantes, horas extras e cobranças de chefias constituem a regra quando o assunto é trabalho nos dias de hoje”, afirma a hipnoterapeuta ericksoniana Adriana de Araújo.

O ambiente de trabalho e as condições organizacionais são fundamentais para que a Síndrome se desenvolva, mas a sua manifestação depende muito mais da reação individual de cada pessoa frente aos problemas que surgem na rotina profissional. A sensação de inadequação na empresa e o sofrimento psíquico intenso desembocam geralmente nos sintomas físicos, quando não dá mais para disfarçar a insatisfação, porque ela afetou a saúde.

O tratamento da Síndrome de Burnout é essencialmente psicoterapêutico. Mas, em alguns casos, pode-se lançar mão de medicamentos como os ansiolíticos ou antidepressivos para atenuar a ansiedade e a tensão, sendo sempre necessária a avaliação e, no caso medicamentoso, a prescrição feita por um medico especialista. “No processo psicoterapêutico, além do enfoque individual para o alívio das dificuldades sentidas, é necessário a reflexão e um redimensionamento das atitudes relativas à atividade profissional, objetivos de vida e cuidados com a auto-estima e com sentimentos mais profundos de aceitação”, defende Adriana de Araújo.

O mercado financeiro

No mercado financeiro, ansiedade e agitação são ingredientes do trabalho. Mas, em excesso, estes componentes podem provocar insônia, variação de peso, exaustão e falhas de memória - motivos que têm levado esta categoria a procurar ajuda médica e psicológica. "Os profissionais do mercado financeiro têm metas muito apertadas, que exigem grande esforço do indivíduo", observa Adriana de Araújo.

O aumento de pacientes vindos do mercado financeiro nos consultórios médicos e psicológicos é fruto do próprio crescimento do mercado de capitais brasileiro, com maior volume de negócios e mais pessoas atuando em bancos, corretoras e gestoras de recursos.

“O problema surge com mais freqüência entre os novatos neste setor, que começam a atuar sem a devida preparação e sem o pleno conhecimento dos mecanismos do mercado de ações. Os mais antigos na profissão estão mais preparados para lidar com a pressão psicológica da atividade que exercem”, afirma a psicóloga. A demanda é maior em momentos de crise no mercado de capitais. Para estes profissionais, “a terapia serve para mostrar que o universo financeiro não condiz com a realidade fora dele. Através de reflexões, mostramos que o cotidiano não funciona assim, que sem saúde física e mental não se pode fazer nada", afirma a psicóloga clínica Adriana de Araújo.

Hora de parar


No decreto N° 3048/99 que regulamenta a Previdência Social, o grupo V da Classificação Internacional de Doenças (CID) 10 menciona no inciso XII a “Síndrome de Burnout, “Síndrome do Esgotamento Profissional”, também identificada como “Sensação de Estar Acabado”. O profissional tem direito a afastar-se uma vez que tenha sido diagnosticada a Síndrome. “É preciso que as empresas se conscientizem da urgência de reavaliar a cultura de exigir dos funcionários metas, às vezes, impossíveis para um ser humano”, alerta Adriana de Araújo.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

NOVAS TECNOLOGIAS E O DIREITO: ALGUNS PROBLEMAS RELACIONADOS AO O USO DA VIDEOCONFERÊNCIA NO PROCESSO JUDICIAL.

POR BELCORÍGENES DE SOUZA SAMPAIO JÚNIOR
maio de 2006.


A atual realidade tecnicista de um mundo cada vez mais informatizado é inegável. Em plagas da vida cotidiana já não conseguimos conceber a subsistência sem as nossas ferramentas tecnológicas como telefone celular, computador, aparelhagem de áudio, vídeo, etc. Muitas destas tecnologias já se incorporaram definitivamente na nossa vida pessoal e profissional.

Fruto de uma constante guerra mercadológica, o progresso tecnológico tem ao seu dispor, além de um óbvio marketing da utilidade, os grandes meios de comunicação propagandista. Disto resulta que dentro de uma órbita de consumo capitalista, estamos sempre a espera da próxima novidade ou do próximo salto tecnológico. Em mundo carente de ideologias duradouras parece que a ânsia consumista se reserva no papel de ilusória miragem de um saciado bem estar.

A intricada rede industrial e comercial hodierna, devorando recursos naturais para produzir bens, empregos e lucros parece nos ter conduzido a um paradoxo modo de vida autodestrutivo. Já não sabemos porque consumimos tanto e tudo. A questão mesma é: consumimos para viver ou vivemos para consumir. Neste sentido a expressão “sonho de consumo” é bastante significativa.

Antes de tentar construir um discurso antípoda com relação ao “progresso tecnológico”, o que tentamos é situar o problema que verdadeiramente nos interessa aqui, a questão da informatização jurídica. De fato muitas são as benesses de se viver em um mundo informatizado. Não se pode negar que o incremento tecnologista nos proporciona grande conforto e facilidades de produção intelectual e científica, isto sem mencionar as novas e grandes dimensões de lazer e prazer. Acreditamos também que na maioria das vezes a tecnologia informática é uma boa aliada das iniciativas de organização racional, celeridade e eficiência.

Nesta breve reflexão, porém, queremos destacar alguns aspectos que julgamos inconvenientes no tocante ao uso da videoconferência em seara processual. Sobre este assunto temos ouvido e lido sobre as grandiosas vantagens em sua aplicação. Conhecemos também algumas clássicas objeções ao assunto, no que não reclamamos nenhum mérito de originalidade nesta abordagem, mas tão somente intentamos reacender alguns questionamentos que julgamos pertinentes.

Perfeitamente assimilada já pelo meio judicial, o uso da videoconferência encontra razoáveis fundamentos de ordem legal, política, econômica, etc. No plano jurídico positivo, na Espanha, está amparada em diversos diplomas e dispositivos, destacando-se os artigos 230 da lei Orgânica do Poder Judicial, como também o artigo art. 229.3 da mesma lei a partir da vigência da Lei Orgânica 13/ 003, como também os artigos 306, 325 y 731 da Lei de Enjuiciamiento Criminal;

As outras e principais vantagens que se costuma apontar como justificativas para o uso da videoconferência são:

a) Economia de tempo e dinheiro;
b) A falta de necessidade de deslocamentos pessoais;
c) Melhor organização do trabalho;
d) Maior eficiencia dos resultados.

Os principais âmbitos destacados para a aplicação desta tecnologia são:

a) As declarações e interrogatórios de testemunhas, peritos, processados e menores;
b) As cooperações judiciais nacionais e internacionais.

LESSIG, falando sobre a dimensão existencial do ciber espaço afirma que: “EL CIBERESPACIO ES UM LUGAR. LÁ GENTE VIVE EN ÉL. ALLI EXPERIMENTAN TODOS LOS TIPOS DE COSAS QUE EXPERIMENTAN EN EL ESPACIO REAL”1 . Ato contínuo tece considerações sobre a ambivalência existencial do internauta que exerce a sua conduta bidimensional de maneira concomitante no mundo real e no mundo virtual.

O que queremos neste instante ressaltar é o fato de que a imagem projetada na tela de um computador em um bate papo internáutico, por exemplo, apesar de existir enquanto uma realidade fática acontece em um espaço específico de existência diferente do mundo real. Este lugar é o “ambiente ou universo virtual” e como tal é regido por uma estrutura própria, sujeita a regras diferentes daquelas existentes no mundo real. Ainda LESSIG: “LOS TEÓRICOS DEL CIBER ESPACIO HAN ESTADO TRATANDO TODAS ESTAS QUESTIONES DESDE EL MISMO NACIMIENTO DEL NUEVO ESPACIO, PERO TODAVIA ESTAMOS EMPEZANDO A ASUMIRLO COMO UNA CULTURA. AÚN ESTAMOS COMENZANDO A OBSERVAR LA ENORME IMPORTANCIA DE LA ARQUITECTURA DE LOS ESPACIOS...”2 . Por fim, argumenta sobre o domínio ou propriedade destas estruturas, o que nos faz ver e refletir claramente sobre as possibilidades de manipulação e controle do ciberespaço e, por assim dizer, no ciberespaço.

Sem precisar adentrar em velhas e desgastadas discussões sobre as imprecisões semânticas ou hermenêuticas que o conteúdo das declarações de testemunhas, peritos e partes podem sofrer em uma transmissão através de videoconferência, pois acreditamos que tal situação se dá também em uma circunstancia presencial, queremos abordar mesmo alguns aspectos margeantes, porém relevantes, envolvidos nestas questões. Sem preocupação de estar dando azo a eventuais teorias de conspiração, o que queremos é levantar algumas considerações que julgamos relevantes dentro da nova liturgia processual que se propõe efetuar via videoconferência.

Passada a euforia inicial que faz surgir declarações apaixonadas sobre o uso desta tecnologia, do tipo: “EL USO DE LA VIDEOCONFERENCIA PERMITE LA TOTAL CONEXIÓN EN LOS PUNTOS DE ORIGEN Y DESTINO COMO SI ESTUVIERAN PRESENTES EN EL MISMO LUGAR, CON LO QUE SE DA CUMPLIMIENTO A LA PREMISA DE QUE SE CELEBRE LA ACTUACIÓN JUDICIAL EN UNIDAD DE ACTO”3 , precisaremos discutir alguns aspectos fáticos sobre o impacto desta dimensão estrutural de realidade virtual, sobre os cânones processuais convencionais.

Sabedores que somos que a jurisdição oficial se reveste como a única legitimada para a solução regular dos litígios em um Estado de Direito, proibida a vindita privata, não podemos desconsiderar que as garantias e os princípios processuais históricos são construções jurídicas indeléveis e necessárias para a construção da verdade processual, seja ela substancial ou formal. Dentro da dimensão da litigância processual, cabe ao juiz apurar a “verdade” dos fatos estabelecendo um juízo cognitivo sobre os acontecimentos trazidos ao seu justo arbítrio. Neste sentido, não podemos desconsiderar que o entorno das filigranas processuais é um rico caldo cultural em que se bebera o magistrado em seu cabedal decisório. O face to face, da inquirição pessoal não produz somente, para o juiz, um amontoado de palavras concretas a serem transcritas em papel. Ao contrário, as reações mínimas do depoente, os gestos, as sudoreses, os tiques, os desgastes, etc, vão conformando o convencimento judicial sobre a questão em julgamento. Acreditamos que tal riqueza fática desaparece por completo com o advento da videoconferência em audiências.

Uma outra dimensão do problema pode se dar no terreno da influencia de fatores exógenos no lídimo atuar investigativo do juiz. Não obstante ao insistente discurso de que as operações de colheita de provas por meio de videoconferência são realizadas com a segurança necessária para refletir a verdade das declarações prestadas, queremos considerar que NADA substitui a segurança de um depoimento presencial. Quando acentuamos esta declaração queremos destacar que a manipulação, ou mau funcionamento, de alguns mínimos fatores tecnológicos pode ocasionar irreparáveis, porém imperceptíveis, prejuízos processuais. Qualquer iniciado em tecnologia de imagens eletrônicas sabe que a simples perda de nitidez pode ocasionar um grande esforço extra do aparelho ótico humano causando, como conseqüência, mal estar e irritação na assistência, incluído o juiz.

“...NO ES IMPOSIBLE QUE SE PRODUZCAN ANOMALÍAS COMO LAS SIGUIENTES: CAMPO REDUCIDO DE IMAGEN, QUE PRODUCE TOMAS ESTÁTICAS QUE CANSAN LA ATENCIÓN; IMPERFECCIONES DE LA GRABACIÓN, QUE HACE NO SE CAPTE CON SUFICIENTE NITIDEZ LAS EXPRESIONES O GESTOS DEL PERITO, O MÁS GRAVE AÚN, LOS DATOS NUMÉRICOS U OTROS ASPECTOS DE LA PRUEBA, QUE EN CONDICIONES NORMALES SON COMPROBADOS «DE VISU» POR EL PROPIO TRIBUNAL, AL ACERCARSE EL DOCUMENTO, OBJETO, UTENSILIO ETC., A LOS MISMOS ESTRADOS; ASINCRONÍA SONIDO E IMAGEN, CON EL PROBLEMA DE NO PODER TENER UNA IMPRESIÓN VALORATIVA CORRECTA DEL LENGUAJE VISUAL QUE ACOMPAÑA AL LENGUAJE ORAL DEL PERITO; DIFICULTADES DE ÉSTE PARA APERCIBIRSE DE LAS REACCIONES DE LA SALA, EL PÚBLICO O LAS PARTES, A SU DECLARACIÓN Y COMENTARIOS, ETC”4.

Poderíamos também acrescentar questões mais complexas como as que envolvem mensagens subliminares sonoras, orais e gestuais, tão conhecidas e debatidas nos estudos de psicologia e comunicação, com fartas provas de existência e eficiência. Também questões de ordem de manipulação de dados através de sabotagem nos programas usados, podem se aduzidas. A manipulação, dependendo da dimensão dos interesses envolvidos, pode ser gerada, inclusive, a partir dos satélites de transmissão das imagens.

Já sob um prisma interno, ou judicial, do problema podemos destacar a evidente vulneração dos princípios processuais da imediação e da publicidade. O primeiro pelo seu próprio caráter ontológico já fundamenta a nossa afirmação. Alegações falaciosas sobre pontuais exceções porventura existentes, como no caso de leitura declarações de testemunha falecida, não servem para obstar este princípio da sua ordem regular de aplicação. As ações a que se reservem a necessidade do sigilo processual podem ser irreparavelmente comprometidas através de sabotagens no processo de envio e recebimento das imagens e sons, o que se torna perfeitamente crível quando sabemos que para a consecução de uma operação de videoconferência exige-se uma grande participação de pessoas e técnicos.

A nossa preocupação no que se refere a esta temática se dá em um momento onde uma profunda alteração conceitual e doutrinária se opera no campo jurídico-político em todo o mundo. Lamentavelmente, ao tempo que encontramos alegres adesões ao universo da informatização jurídica, encontramos também uma perda coletiva das capacidades críticas de uma crescente maioria de operadores do direito sobre estas questões:

“ (...) SOSTIENE (SARTORI) QUE LA VIDEO-POLÍTICA, CON LAS VIDEOS-ELECCIONES Y LOS VIDEO-ACONTECIMENTOS, HA AUMENTADO LA DISTANCIA ENTRE LA INFORMACIÓN Y LA COMPETENCIA COGNOSCITIVA (...) LA LLAMADA REALIDAD VIRTUAL EN UNA IRREALIDADE QUE SE HA CREADO CON LA IMAGEN Y QUE ES REALIDAD SÓLO EN LA PANTALLA, AMPLÍA LAS POSSIBILIDADES DE LO REAL PERO NON SON REALIDADES”5 .

As transformações político-sociais que assistimos hodiernamente nos indicam a ocorrência de uma grande alteração, para pior, no modelo jurídico atual. Recentemente, os jornais espanhóis assinalavam a observação do primeiro ministro inglês Tony Blair, de que o conceito tradicional de liberdades civis se tornou obsoleto.6 Acrescentando a este caldo autoritarista a política de supressão de direitos civis norte americana e o endurecimento das teocracias no oriente médio, por exemplo, não fica difícil enxergar, em um exercício de prenuncio do “sinal dos tempos” (o que BOBBIO chama de “história profética”7 ) de um ataque global ao conceito de Estado de Direito levando a rodo, também, as garantias processuais.

“EM UN MUNDO INTERDEPENDIENTE, EN EL SENO DE SOCIEDADES INTERCONECTADAS, LA GARANTIA DE LOS DERECHOS CÍVICOS, SE HALLA EN DIRECTA CONEXIÓN, PARA BIEN O PARA MAL, CON LOS PROCESOS QUE DEFINEM SU INSTALACIÓN TECNOLÓGICA... SE TRATA DE LOGRAR QUE LOS DESARROLLOS TECNOLÓGICOS NO MENOSCABEM NI SE ALCANCEN A COSTA DE LAS LIBERTADES CÍVICAS ”8.

Estamos convencidos que em um espaço de atuação cada vez mais marcado pela tecnologia nos cabe indagar se em seara da solução judicial de conflitos, não deveríamos estar mais atentamente antenados com o esboço ideológico entronizado pelos donos da produção tecnológica. Talvez a “fuga para o mundo real” seja a segurança que precisamos no processo judicial. Uma tabela de custos menores ou um simples raciocínio de conveniência não deve ser motivo para riscos ou tergiversações com os direitos e garantias fundamentais.

Acreditamos que ainda muitas outras questões poderiam ser levantadas no que se refere a este delicado tema, e que o uso de tal tecnologia no processo deve ser urgentemente melhor debatida. Não obstante o caráter “útil” da videoconferência, e o fato mesmo da sua já comprovada difusão em seara de cooperação judicial internacional, sugerimos que a sua aplicação seja restrita aos casos de TOTAL impossibilidade de realização de audiência presencial.

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1 - LESSIG, Lawrence. El código y otras leyes del ciberespacio. Trad. Ernesto Alberola. Madrid: Santillana, 2001, p., 348.
2 -Idem, p., 27
3 - MAGRO SERVET, Vicente. Experiencias de un juicio celebrado por videoconferencia. En: Revista de Derecho Penal Procesal y Penitenciario, abril 2004, n.º 04.
4 - URBANO CASTRILLO,Eduardo de. La prueba pericial videográfica. En: Revista de Derecho Penal Procesal y Penitenciario, abril 2004, n.º 04.
5 - BELLOSO MARTIN, Nuria. Nuevas tecnologias: Proyecciones sociales, iusfilosóficas y políticas. En: Estudios Jurídicos Sobre la Sociedad de La Información y Nuevas Tecnologias. Burgos: UBU, 2005, p. 158.
6 - LA VANGUARDIA. La elección entre libertad y seguridad centra el debate intelectual en los comicios ingleses. Miércoles, 03 de maio, 2006, p. 08
7 - NORBERTO BOBBIO. A era dos direitos. São Paulo: Elsevier, 2004, p. 221.
8 - PÉREZ LUÑO, Antonio-Enrique. Internet y la garantía de los derechos fundamentales. En: Estudios Jurídicos Sobre la Sociedad de La Información y Nuevas Tecnologias. Burgos: UBU, 2005, p. 14.