quinta-feira, 8 de setembro de 2011

A CHAVE DO JURISTA

Prof. Goffredo Telles Junior


Preciosa ciência é a ciência dessa disciplina! Preciosa ciência é a Ciência do Direito!

O conhecimento científico da disciplina jurídica da convivência é luz não somente para o exercício das profissões na área do Direito - para os advogados, os juízes, os promotores públicos, os delegados de polícia mas, também, para o exercício de profissões em muitas outras áreas de trabalho. Por exemplo, ela é luz para o bacharel que for comerciante, industrial, agricultor, banqueiro, médico de família, psiquiatra, engenheiro arquiteto, urbanista, ambientalista.

A Ciência jurídica da Disciplina da Convivência é luz para o comportamento nas ocorrências graves do dia-a-dia. É luz para o relacionamento de marido e mulher, de pais e filhos, de companheiros e companheiras. É luz para transações, para tomadas de compromisso, para a honra da palavra dada. É luz para as decisões cardeais; para a adoção de um ofício ou meio de vida, e para as correções de rumo. É luz para o relacionamento com patrões, com empregados; para o trato com chefes, e dos chefes com seus secretários e demais subordinados. É luz para vinculações com sócios, com parceiros, com condôminos, com vizinhos. É luz para as opções finais, diante das grandes alternativas, e para a escolha do caminho nas encruzilhadas da existência. Até pode ser precioso para os roteiros de romancistas e poetas. E, certamente, é clarão norteador utilíssimo para políticos, economistas, sociólogos, jornalistas.

Quem fizer, com seriedade, o curso de uma Faculdade de Direito, e obtiver o conhecimento científico da Disciplina da Convivência, está pronto para a vida. Está superiormente formado para enfrentar as exigências do quotidiano.

O diplomado em Curso de Direito sabe o que é permitido e o que é proibido pelas leis. Possui, pois, o conhecimento básico de como se deve conduzir nos encontros e desencontros, nos acertos e desacertos, de que é feita a trama da comunidade humana.

Ao completar o Curso de Direito, o estudante se promove a bacharel na Ciência de Conviver. Seu diploma é uma CHAVE, a primeira CHAVE para as portas do mundo. É o título valiosíssimo de quem estudou as formas legais e ilegais dos relacionamentos humanos, e se informou sobre os caminhos e descaminhos do comportamento.

Por força desta mesma razão, abre chaga no seio da sociedade, o bacharel corrupto. Seja advogado, seja juiz, promotor de justiça, delegado de polícia, o bacharel corrupto é uma triste figura. É traidor de seu diploma e da categoria profissional a que pertence. É traidor da ordem instituída – dessa ordem de que ele é construtor, esteio e intérprete. O bacharel corrupto é traidor da Disciplina da Convivência, da qual ele é natural sentinela e guardião.

O PRIMEIRO MANDAMENTO

Poderá, talvez, algum cético, algum espírito desencantado com a moral da vida, pensar que nada disto é verdade. Que fundamento, que razões asseguram a validade autêntica de uma qualquer ordenação positiva, de um qualquer sistema legislativo? Onde está - indagará o descrente -, onde se encontra, nessa instável e movediça disciplina, a rocha viva, a garantia de um princípio excelso e perene, que seja mais alto, mais seguro do que as oscilantes e efêmeras leis, de que são feitas as estruturas jurídicas, existentes sobre a Terra?

Uma estória antiga nos conta que um moço aflito deparou Jesus numa vereda, e, trêmulo, perguntou:
- Mestre, que devo fazer para merecer o Céu?
Jesus respondeu:
-AMA TEU PRÓXIMO COMO A TI MESMO.

Deixemos de lado, se quisermos, o caráter religioso dessa narrativa.
Fiquemos, apenas, com o que ela exprime.

No mandamento proferido, lobrigamos a resposta às indagações do cético. Nele descobrimos o ansiado princípio, o princípio "mais alto ", a máxima anterior à singela norma do respeito pelo próximo.

Esse luminoso mandamento - forma de um sentimento recôndito, muitas vezes nem bem consciente, mas natural e norteador no coração humano dos verdadeiros legisladores - é, certamente, a primordial razão-deser das ordenações sociais.

Ela não é jurídica, essa norma, pronunciada por Jesus. Mas ela manifesta uma condição preciosa de entendimento e harmonia. Nela está uma inicial inspiração, a recomendação basilar, da qual a inteligência infere de conjuntura em conjuntura, de degrau em degrau - todos os imperativos e todas as interpretações das disposições jurídicas. Com a consciência apoiada nesse PRIMEIRO MANDAMENTO é que os legisladores sinceros são misteriosamente conduzidos, na construção de seus edifícios normativos. É com ele na subconsciência que os juristas manejam a sua CHAVE, ao empregar a lógica do razoável, na interpretação das leis.

Quando os construtores e os intérpretes se apartam dele e o invertem, por erro ou por algum nefasto motivo, a Disciplina da Convivência perde seu alicerce, se desvirtua, se corrompe, passa a infelicitar a comunidade. É o que acontece, por exemplo, quando a disciplina legítima da convivência é substituída pelas ordens do arbítrio, dos autocratas e déspotas. É também o que acontece nas épocas de falsa democracia, em que o Governo esquece sua verdadeira missão de meio, a serviço das pessoas; administra a Nação com cegueira para as necessidades vitais da multidão - despegado das carências e precisões das pessoas, dos trabalhadores de todas as categorias -, e se volta, com desalmada prioridade, para interesses "globais", muitas vezes ilegítimos, de um Estado divorciado do Povo.

O amor pelo próximo é princípio subliminar da ordem. É o sentimento prirneiríssirno, o primeiríssimo elã da alma, dos que são levados a conviver numa comunidade. Mesmo quando obumbrado, não bem percebido ou expresso, ele é o cimento subjacente da união dos seres na sociedade. É o elo tácito da comunhão humana.

Em verdade, o amor constitui, no imo da consciência de legisladores e intérpretes, a matriz silenciosa, o submerso manancial, a inspiração geradora da Disciplina da Convivência. É a origem mais pura, mais profunda da legislação: a causa das suas causas.

É a fonte natural do Direito.

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Goffredo Telles Junior
Livro: Iniciação na Ciência do Direito
Ed. Saraiva
Cap.XXXVIII

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